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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
"... essa mitologia cultural europeia, com a sublimação da Grécia e a subalternização de Roma, resultando da complexa relação de nossos sucessivos presentes - o nosso também -, com um passado sempre outro na luz desses presentes, tem a sua lógica. Acrescente-se que essa sublimação do helénico em detrimento do latino - já presente na própria cultura romana - faz parte de um combate de outra ordem que a meramente cultural, que tem como objecto, explícito ou implícito, a imagem e o papel do cristianismo na história da civilização europeia. À latinidade ficará associada a catolicidade, na sua versão historicamente justa de romana. (...)Quando, no século XIX, o germanismo se começa a impor, como discurso filosófico, filológico e cultural, surge então, como reflexo de área cultural em perigo - como hoje com a América - a ideia de defesa de latinidade e mesmo de uma romântica União Latina, sonho de poetas (Mistral) mais do que de historiadores e políticos. Essa ideia nebulosa não vai além da sua expressão folclórica, exalta a latinidade dos povos latinos, na Europa ou fora dela, como herdeiros e exemplo de um modo de ser, de certo modo de uma visão do mundo, de um gai savoir que, embora sem relação profunda com a visão de Nietzsche, reenvia para um certo paganismo provençal um culto das realidades solares e naturais que vale bem e mais do que o culto nórdico do progresso científico, em sua, do que se chamava então e ainda hoje "o materialismo" ou, na sua forma soft, o pragmatismo."(Eduardo Lourenço, "Digressão Sobre a Latinidade", A Morte de Colombo. Metamorfose e Fim do Ocidente Como Mito, Lisboa, Gradiva, 2005, pp. 138-140)