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Sururu em Portugal. O secretário-geral do Partido Socialista afirma-se "chocado", o líder sindicalista dos professores apela à emigração do primeiro-ministro, meio mundo resmunga contra Passos Coelho, nos blogs, nos jornais, nas redes sociais. O primeiro-ministro, dizem, mandou os professores emigrar, uma espécie de "Arreda", "ponham-se na rua". Eu, professor emigrado, e que sei que se voltasse para Portugal nestes meus quase 50 anos estaria em maus lençóis (ou, para ser mais certeiro, em nenhuns lençóis), fico aturdido. Então o homem diz uma coisa dessas, desrespeitando a classe profissional? Dando trunfos destes aos adversários políticos, ainda para mais nesta altura de grande crise? É inacreditável.

 

Depois, e por culpa do Cachimbo de Magritte vou ler o que o primeiro-ministro disse [aqui]. Vou citar a parte que tanta celeuma provocou. Mas o contexto da entrevista é óbvio, colocam-lhe questões sobre a emigração para Angola e Brasil, e sobre a exportação de bens e serviços para esses países. Depois:

 

CM - Para já, estamos a exportar mão-de-obra, cérebros, massa cinzenta...

PPC- Mas bens e serviços também.

CM- É certo que sim. Mas esteve em Angola recentemente. É um país que pode receber portugueses para trabalhar essencialmente em que áreas? Na Educação, por exemplo?

PPC- Angola não é um destino de mão-de-obra portuguesa, excepto de mão-de-obra muito qualificada.

CM- Não é? 140 mil portugueses...

PPC- Já tem sido. É difícil que possa ser muito mais. Angola já foi, para muitas empresas portuguesas, uma oportunidade de crescimento alternativo ao mercado interno e ao mercado europeu. Tem sido assim, sobretudo nos últimos 5/7 anos. É muito pouco provável que haja capacidade em Angola para absorver muita mão-de-obra portuguesa. O que não quer dizer que não possa ainda vir a receber certo tipo de mão-de-obra muito qualificada em certos segmentos.

CM- Por exemplo?

PPC- Em tudo o que tem a ver com tecnologias de informação e do conhecimento, ainda em áreas muito relacionadas com a Saúde, com a Educação, com a área ambiental, com comunicações. Todas estas que referi, além das tradicionais, que já lá estão implantadas e que têm que ver com infra-estruturas nos mais diversificados domínios, infra-estruturas rodoviárias, marítimo-portuárias, ferroviárias, logísticas. Como sabem, as empresas portuguesas, desse ponto de vista, não ficam a dever nada às grandes empresas estrangeiras que estão implantadas em Angola.

CM- Por exemplo, aos professores excedentários que temos, e temos muitos, aconselharia a abandonarem a sua zona de conforto e a procurarem emprego noutro sítio?

PPC- Em Angola e não só. O Brasil também tem uma grande necessidade, ao nível do ensino básico e secundário, de mão--de-obra qualificada. Sabemos que há muitos professores em Portugal que não têm, nesta altura, ocupação. E o próprio sistema privado não consegue ter oferta para todos. Estamos com uma demografia decrescente, como todos sabem, e, portanto, nos próximos anos haverá muita gente em Portugal que, das duas uma, ou consegue nessa área fazer formação e estar disponível para outras áreas ou, querendo manter-se sobretudo como professores, podem olhar para todo o mercado de língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa.

 

Ou seja, perguntam ao PM o que se pode exportar para Angola e Brasil, dada a crise na Europa, nosso grande mercado. Perguntam-lhe que áreas de actividade serão as melhores em Angola. E as mais chamativas para emigração. Ele refere algumas, em áreas determinadas e em trabalhadores de elevada formação. Perguntam-lhe se os professores excedentários poderão emigrar para  Angola. Passos Coelho já tinha referido (algo que todos sabem): a) há crise generalizada; b) há desemprego.  E sobre esta matéria do futuro profissional dos professores diz: c) há falta de alunos, há excesso de professores; d) há crise demográfica, o que torna o problema de longo prazo; e) não há mercado privado para substituir os empregos estatais. Pelo que os desempregados devem tentar alguma formação e de reconversão profissional (a crise no sector é, entenda-se, de longo prazo). Ou então em "querendo manter-se sobretudo como professores, podem olhar para todo o mercado de língua portuguesa e encontrar aí uma alternativa". E mesmo neste caso tem a lucidez (raríssima em políticos de Lisboa) de remeter essa hipótese de uma emigração de docentes fundamentalmente para o Brasil, pois é óbvio que a integração de docentes portugueses nos sistemas educativos africanos levantam questões que muito ultrapassam a vontade migratória.

 

Conclusão dos seus oponentes, Tó-Zé Seguro à frente? O primeiro-ministro mandou os professores desempregados emigrar! Eu consigo perceber muitas das pessoas que escrevem na internet repetindo que o tipo é que devia emigrar. Qualquer tipo que tenha um blog e, principalmente, um mural de facebook sabe que há imensa gente que pura e simplesmente não lê o que clica (o célebre "like" do facebook) e o que comenta. É a urgência de ser, de existir, através do cliquismo, da assinatura na petição, no urro, no choro. Há imensa gente que vive no eco, nada mais.

 

Mas aqueles que têm algum tipo de responsabilidade, e nisso vai à frente o Tó-Zé Seguro, que tralha é esta? É pura desonestidade intelectual. E se nunca é altura para essa politiquice no estado em que as coisas andam muito menos o é. Este é aquele tipo de manipulação rasteira que deve ser cobrada. Com apupos. E, mais do que tudo, com votos.

 

jpt

publicado às 04:49


24 comentários

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De jpt a 21.12.2011 às 11:22

Estou com o 1B, essa dos patrícios a urrar para a Lua está no alvo.
1B o caudilho já estaria (rotativo?) por aí não fosse a famigerada Senhora Mérkél
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De mvf a 21.12.2011 às 13:10

Quanto à reconversão estamos, estaremos de acordo. É aliás coisa humana a adaptabilidade às circunstâncias mutantes, não excluindo o luso, evidentemente. A minha questão não é (nem poderia ser por natureza minha)essa. Ora, o 1ºministro sugeriu a saída de Portugal como escape e, ao que vemos não está só. Já antesum Sec de Estado tinha vindo com ideia parecida em relação aos jovens. Será neo-proto-programática a ideia de emigração? O gordo Paulo Rangel, euro-deputado-emigrante temporário, adianta mesmo uma agência nacional para ajudar o desempregado a fazer-se à vida fora de Portugal. Claro que para montar o dispositivo teria de se meter lá uns quantos boys que não vai havendo lugar para todos nas admnistrações hospitalares.
Aqui fica transcrito do "Publico":

“Às tantas, nós até devemos pensar, se houver essas oportunidades, em, de alguma maneira, gerirmos esse processo. Talvez fosse uma forma de controlar os danos. Era ter, no fundo, uma agência nacional que pudesse eventualmente identificar necessidades e procurar ajustar as pessoas que tivessem vontade - não é forçar ninguém a emigrar, não se trata disso - e canalizar isso”, afirmou Paulo Rangel.

Questionado pelos jornalistas, à entrada para uma reunião do Conselho Nacional do PSD, num hotel de Lisboa, Paulo Rangel disse não ver “motivo para escândalo” nas declarações do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, sobre a emigração dos professores que não conseguem colocação nas escolas portuguesas.

No entender do ex-líder parlamentar do PSD, a posição assumida pelo primeiro-ministro, apontando a emigração como uma opção para essas pessoas, não devia suscitar escândalo: “Pelo contrário, ela devia suscitar um debate sério na sociedade portuguesa, para tentarmos, na medida do possível, acomodar as necessidades do País em termos de mercado de trabalho no exterior”.

Segundo Paulo Rangel, a emigração pode ser, não “uma primeira solução”, mas “uma segunda solução” para “pessoas que têm condições para isso, que ainda não têm a sua vida montada, que são mais jovens, mais ligados à aventura”, porque “pode ser uma forma de as pessoas terem rendimento, de terem uma experiência, de terem uma ligação ao País feita de outra maneira, de servirem também o País”.

Isto não se aplica a “profissionais que já estão na casa dos 40 anos, que já têm as suas famílias formadas, que têm filhos em idade escolar”, ressalvou, insistindo que não se deve “diabolizar a emigração, especialmente de quadros qualificados, como uma saída provisória, como uma má saída, mas uma saída para a crise”.

O eurodeputado do PSD argumentou que “é uma evidência” que “no caso da educação, com a baixa da taxa demográfica, não há lugar para todos os professores” e que é preciso “encontrar saídas para as pessoas” desempregadas.

“Ou os senhores querem que as pessoas fiquem em casa à fome e a viver do fundo de desemprego, é isso que querem?”, questionou, dirigindo-se para os jornalistas.

Paulo Rangel recusou que seja um sinal de derrotismo um primeiro-ministro apontar a emigração como uma opção: “Eu acho que não é. Nós não podemos estar sempre a dizer que queremos que os portugueses estejam em grande cooperação no Brasil, em Angola e Moçambique, que queremos ter pontos de contacto espalhados pelo globo, que os portugueses têm uma diáspora muito ativa, e depois achar que isto é uma coisa terrível e tenebrosa”.

Tem razão, no entanto, o gordo: é terrível e tenebroso. Ele, quero dizer.
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De O Emigrão | ma-schamba a 24.12.2011 às 11:24

[...] da polémica em torno da entrevista de Pedro Passos Coelho [ler aqui; sobre isso já escrevei 1, 2 3] em que o primeiro ministro terá mandado emigrar os professores desempregados. Esta [...]
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De jpt a 22.12.2011 às 01:06

Jorge Nunes, há muitos Jorges (e Josés) sob este céu ...

Quanto ao resto, não foi num postal mais recuado, é mesmo sempre, isto não passa de um conversa de café. E, quando está melhor, a gente prolonga-a até a um bar mais porreiro.

Quanto à sua questão - uma das questões que não abordei nesta parvoíce sobre a entrevista do PM, e que de certa forma seria a mais importante (e quem lê o ma-schamba e já me viu escrever sobre o chapéu-de-chuva "lusofonia" pode deduzir do meu interesse e mal-estar) é a estupidez colectiva que grassa no seio dos comentadores, a de que há países esperando professores ou emigrantes portugueses como de pão para a boca. É a tal "lusofonia" (falamos a mesma língua, somos amigos irmaõs, vocÊs precisam da nossa "ajuda" e nós vamos para aí - então e logo professores, não há falta?, claro que há, nós vamos ajudar). Isto não é infantilidade, é mesmo senilidade intelectual. Mas enfim, passando. Não é só o a logística (já viu aquela jornalista doutoranda que sempre foi muito inteligente que ganha pouco e tem dois filhos e precisa do apoio dos pais e que quer que o governo emigre porque o PM a mandou emigrar e que tem amigos bloguistas e facebookistas e na televisão e que escreveu uma palhaçada aberta ao PM? já viu aquela troncha metida a dar aulas em Sussundenga com os dois filhotes? a casa, o taco, as viagnes, o carro (que afinal a tv diz que ainda tem) tudo aquilo? Pois não é isso, a questão é que não pode dar aulas ... mesmo que quisesse trazer o coiro para aqui mais os little bastards atrás, para o meio da malária e dos 200 euros por mês tinha que se formar para dar aulas. Burocracia, restrições? Não apenas. Mas porque acima de tudo os programas são diferentes, as pedagogias são diferentes. E porque ninguém a compreende, que naó vai para o meio da tralha facebookista bloquista feminista que se lhe alapou. É esse o ponto, que essa tropa fandanga nem imagina, entre os xópings e as concentrações de indignados. São desempregados? São indignados? Talvez. Mas o pior é que o mundo se está a cagar neles. E merecem-no.
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[...] 1. Abaixo já abordei a falsidade das interpretações da entrevista de Passos Coelho (umas resmungonas, muitas paroquiais, algumas malevolamente estratégicas e até algumas lamentavelmente pungentes [roda na internet uma carta aberta ao primeiro ministro que é uma peça inadjectivável, e que deveria envergonhar quem a reproduz, salivando]). Voltei ao assunto aqui (irritado com os que querem a infantilização dos cidadãos) e aqui (já a ver-me a votar nas próximas presidenciais em Ferro Rodrigues ou Guterres: o “pequeno Marcelo” nunca!). [...]
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De Jorge Nunes a 21.12.2011 às 20:14

O JPT referiu num dos seus postais mais recuados, que isto dos blogs era como uma conversa à mesa do café. O problema é que uma pessoa levanta-se da mesa para fazer uma necessidade (regressar a casa; dar de comer aos filhos pois aos dias de semana é pai “solteiro”; tratar da vida doméstica; etc.) e quando regressa à mesa do café já é um novo dia, a conversa já vai longa e se calhar a nossa reentrada já vai um pouco a destempo, mas tem se fazer o gosto ao dedo.

JPT, no postal «O “coachismo”, novo sistema de governo», não sou eu quem refere as declarações do Miguel Relvas é outro Jorge.

Quanto à sua resposta à minha questão, que muito agradeço, veio confirmar a informação que me foi dada por um brasileiro, por alturas do referendo de Timor, sobre o desagrado demonstrado por Moçambique face a uma hipotética, na altura mesmo só hipotética, emigração maciça para aí. Em Angola as razões serão as mesmas, agravadas por alguma sobrecarga da nova emigração lusa. Quanto aos salários dos docentes não faço de facto a menor ideia, calculo que sejam baixos, mas depois lemos na nossa imprensa sobre o custo de vida em Angola (Luanda) e ficamos perplexos, a menos que os preços para os nacioanais esejam diferentes.

Quanto à gincana com as apalvras do PPC estamos de acordo, conforme se viu no postal acima
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De VA a 20.12.2011 às 23:41

Pois é, jpt...creio que Portugal inteiro ainda não percebeu a necessidade de 'reconversão' tanto profissional como pessoal...a questão é de facto estrutural e transversal (esta também está muito na moda)...trata-se de pensar que as economias, as relações sociais, as administrações internas e externas, a educação, a saúde, etc,etc não mais terão a mesma medida... Fala-se muito na falência do capitalismo como nós sempre o conhecemos, mas também se trata da falência do indivíduo...um indivíduo que tem necessariamente de saber reposicionar-se e 'reconverter-se'...Não haverá mais direitos adquiridos (as reformas por exemplo não mais serão um porto seguro)e a criatividade (ou o caos, é idêntico)imperará.
Este é um momento histórico em que o individuo pode ter a possibilidade de conferir um pouco de sentido à sua existência.
PPC tem consciência da necessidade de um novo posicionamente individual a nível mundial, só isso! Mas as gentes de Portugal estão em pânico e urram...o prior é que só urram para Lua, nada mais!!!
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De VA a 20.12.2011 às 23:47

Errata: o pior...

Também é o momento para, solidamente, construir o futuro...Daí as tuas questões serem prementes e, obviamente, certeiras...urge massa crítica, não nos moldes que conhecemos mas a partir de uma reflexão profunda sobre como o fizemos até aqui...
Mas ainda não perceberam que o mundo mudou à brava???
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De umBhalane a 21.12.2011 às 10:17

"Mas as gentes de Portugal estão em pânico e urram…o pior é que só urram para Lua, nada mais!!!"

Vénia.

Tirando as exclamações, pois não constitui surpresa, admiração, não é nada de novo!!!

As gentes, bem dito, estão à espera de uns quaisquer D. Sebastião, a sair de uns quaisquer quartéis para "resolver" o assunto.
E no dia seguinte à consolidação, é preciso cuidado, aos milhões estarão a ovacionar o caudilho com toda a força pulmonar, e a abjurar o passado recente.
Típico.

Gentes.
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De jpt a 23.12.2011 às 23:49

Mais do que o desconhecimento da realidade, que até certo ponto é algo normal, o que custa ver é a espantosa quantidade de umbiguismo que grassa nesse nosso país. Repara bem, JN, que em todo o estapafúrdio bruááá que a entrevista de PPC provocou (e para além de outras questões que procurei abordar, ainda que en passant, em postal ou em comentário) um único teclista dos que interpretam PPC como mandando emigrar os desvalidos professores - desde os mais nacionalistas direitistas, que já andam a facebookar sobre a necessidade de expulsar os imigrantes em Portugal, até aos mais amantes dos terroristas de extrema-esquerda - não houve, dizia eu, um único desses teclistas que perguntasse (invectivando, claro) ao PM se os respectivos países para os quais ele está a mandar emigrar estariam na disposição de os receber [partindo da óbvia constatação que caso isso não acontecesse tal significaria a total incompetência de PPC, o desvario do seu discuros]. E é óbvio porquê, porque acham que seriam certamente bem-vindos. E, também, porque não é claramente essa a questão mas apenas a resmunguice, tresloucada.

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