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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
Passei o último ano a olhar o mar, a saborear todos os prazeres e perigos que oferece e esqueci-me de abrir um livro, de olhar as gentes, de usufruir das palavras e dos pensamentos. Esqueci-me da surpresa, do acaso, do imponderável, do reconhecimento, dos pares e dos ímpares. Pensei que o mar colmataria tudo isso. Mas o mar é demasiado vasto e a vida, a nossa vidinha, não se compadece com a insustentabilidade das ideias.
O mar estará sempre lá, nunca conseguirei viver sem ele, muito menos sem o mistério com que me brinda diáriamente. Tão pouco conseguirei viver sem o confronto que me proporciona quando, trocista, testa os meus limites.
Mas a sensação de correr atrás do inatingível que pautou o último ano começa, finalmente, a esboroar-se e a bonança espreita-me prazerosa. Aquele bem-estar que permite mergulhar na leitura de um livro, enveredar por pensamentos ternos e doces, adiar por um minuto compromissos importantes, começa a impor-se na minha rotina.
A bonomia começa a invadir-me devagarinho e a generosidade dos dias grandes entranha-se-me na pele. Respiro cada minuto como se durasse para sempre, abro um livro, olho o mar e mergulho nas histórias etíopes que trouxe comigo.O vento sopra forte, a temperatura desce um pouco, sinto algum frio, abro um livro, olho o mar e mergulho na história da criança sul-africana vítima do apartheid.
A chuva começa a cair fortemente, as mesas do café ficam molhadas, as pessoas debandam do local, abro um livro, olho o mar, sorrio. Mergulho na vida. É Primavera.
VA