Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




O som do Acordo Ortográfico

por jpt, em 14.10.12

 

A aluna tem 10 anos. Está no 6º ano de escolaridade. Boa aluna e lê bem, bastante bem. Para a disciplina de Matemática tem um "Caderno de Actividades" (de Ana Ribeiro Rosa, Lourdes Neves e Natália Vaz. Publicado por Raiz Editora). Hoje realiza a Ficha 7 dedicada a "Números Naturais". Uma das perguntas é esta:

 

"Que conjeturas fazes sobre os números que podem ser escritos como potências de base 2?".

 

A aluna, a qual, e repito, lê bem, lê-me: "Que conjetúras fazes sobre os números que podem ser escritos como potências de base 2?". Eu emendo-a, de imediato, digo-lhe "conjéturas". Ela responde-me: "mas não está lá nada para que seja assim!". Eu mantenho a emenda. Apenas com o argumento da autoridade, claro, dado que estou graficamente desprovido de qualquer outro. Ela aceita, pudera. Mas resmungando (pois "quem sai aos seus ...").

 

jpt

publicado às 17:51


8 comentários

Sem imagem de perfil

De SC a 15.10.2012 às 22:05

Comecemos pelo uso do anonimato: ou não é consentido neste blog ou é-o. Sendo-o, não é admissível que o seu uso seja depois invocado, à laia de argumento, quando quem o invoca é o mesmo que o admite... Se acha mal, acabe com essa possibilidade.
Adiante. Percebi, infelizmente, o que leu.
Quanto à comparação com as instruções dadas aos professores alemães, não me parece que seja descabelada já que o cerne da questão é o do dever do professor enquanto agente do saber perante pressões da hierarquia estatal.
O "descabelado" estaria unicamente na comparação das consequências para os Professores alemães que se recusaram a enganar os seus alunos e os que em Portugal, façam o mesmo em relação ao dito acordo, de proporções inéditas na história da humanidade (e que, no seu construtivismo totalizante nem Hitler nem Staline achariam indigno dos seus regimes).
Aqui, apesar do descabelado que efectivamente seria comparar consequências, por serem mínimas as daqui, parece que é sem muitos problemas que o governo conta com os professores para negar a uma geração o direito à sua língua, impondo uma decisão materialmente totalitária e ditatorial, e como confessa Casteleiro, com confessados fins políticos, no caso o do ultra-nacionalismo brasileiro.
Sem imagem de perfil

De jpt a 16.10.2012 às 07:19

SC a opção deste blog é aceitar (a agradecer) os comentários. Sem os barrar ("editar", ponderar). Nem apagar (com única excepção dos que, muito raramente, surgem a insultar ou caluniar). O que lhe disse, e repito, é que V. não compreendeu o texto (muito em especial, não compreendeu o seu locutor, este bloguista que lhe responde). O que lhe disse também é que ao fim de nove anos de bloguismo posso encontrar uma relação (diria até uma correlação) entre o explicitar da incompreensão e a prática do anonimato no mundo do bloguismo.

Quanto ao AO, discordo, radicalmente. Não tanto pelo facto de ser uma deriva do ultra-nacionalismo brasileiro como refere (será, em alguns casos, como também o é para o ultra-nacionalismo português, ou um tardo/serôdio imperialismo português) mas, e fundamentalmente, porque é um produto de um pensamento pobre. E que, para mais, prejudica a prática da língua, da intercompreensão. Ainda assim, e por mais que seja adverso a este AO, acho um manifesto exagero considerá-lo uma "negação à língua". Isso são argumentos altissonantes cujo irrealismo só favorece ... a adopção do próprio AO.

Para terminar, e passando por cima das alusões a Estaline e Hitler, que insisto em me parecerem totalmente descabeladas (ensinar "conjetura" sem "c" não tem comparação com as torpezas que os regimes referidos incluíam nos programas docentes), explicito a sua incompreensão, sobre a qual se permitiu tamanha invectiva. Eu não sou o professor da aluna, não lhe ensino "conjetura". Sou professor mas não destas matérias. E na minha docência não tenho, por enquanto, de seguir o AO 90 (dado que vivo num país livre de AO 90). Neste caso, singelo, sou o pai, e estou a explicar-lhe algumas dúvidas no seu estudo. Como vê incompreendeu. E "falou d'alto". E, insisto, quando se assina os escritos normalmente (normalmente, friso) somos menos lestos a este tipo de espalhanços.
Sem imagem de perfil

De SC a 16.10.2012 às 15:54

Começando pelo meio: nada, mas absolutamente nada pode justificar a adopção do "ao".
Quanto ao que diz: sim, não me apercebi que o autor do "post" não era o professor - leituras em diagonal.
Sim, acredito que seja verdadeira a relação que aponta entre o anonimato e "incompreensões". No meu caso usei de um anonimato mitigado, já que as iniciais são, de facto, as minhas e uso-as como usa as suas.
Ainda me quero penitenciar do tom, que tem o seu quê de sentencioso, mas sem poder deixar de acrescentar que, por desagradável que seja, o prefiro ao nacional-hesitacionismo que acaba por tudo consentir.
Em relação ao restante:
O imperialismo, a existir, é dos acordistas brasileiros e portugueses sobre as antigas colónias portuguesas - e sobre os próprios portugueses (já que se trata da sujeição à "ortografia nacional brasileira", confessadamente adaptada à fonética brasileira). Pelo contrário, quem se opõe ao «acordo» em Portugal não pretende impor nada seja a quem for a qualquer outro povo ou conjunto de utilizadores da língua, pelo que não colhe qualquer acusação de imperialismo...
O acordo, tem razão, é produto de um pensamento pobre, de um positivismo ultrapassado; mas é uma pobreza espavantosa e perigosa, que radica no construtivismo totalitário, observável pela primeira vez na história do mundo, no estado iluminista e maçónico da revolução francesa (de que são exemplos a redonominação do calendário, imposição de formas de tratamento pessoal, a descritinização forçada e que culmina com o genocídio (hoje assim legalmente classificado) físico e cultural (homicídios em massa e proibição do bretão com imposição do francês) do Povo Bretão. Não esqueçamos a posterior imposição de ente supremo, por decreto e, claro, il va sans dire, centenas de milhares de mortos).
Mas vamos para a escola:
perante a imposição estatal de um qualquer aspecto ideológico, a questão é a mesma, trate-se da crença na eugenia pelos nazis em 1933, seja a lenda do milagre de Ourique, seja a modificação da ortografia por questões políticas (Malaca dixit: "É que isto [ao] não é uma questão linguística, é uma questão política, uma questão muito importante do ponto de vista da política de Língua no âmbito da Lusofonia").
A questão é de como deve o professor reagir. É conivente? Não o é e está disposto a arcar com as consequências - que podem ir da morte a perseguições mais ou menos disfarçadas (como consta que há em Portugal)? A questão será, antes de tudo, de integridade e coragem. E tanto que assim é que encontramos Professores na Alemanha nazi que se opuseram (e repare que não se tratava sequer de defender a raça ariana) e encontramos em Portugal quem impinja as tontices do acordo, com que não concordam, aos seus alunos...
Uma tentativa de reforma ortográfica em França (que modificaria algumas dezenas - poucas - de palavras) levou a uma declaração conjunta de todos os prémios Nobel franceses então vivos e ao vivo repúdio por parte das Universidades e editoras. A Língua Francesa está, é evidente, a salvo de tontices e rapaziadas, e talvez por isso, estabilizada tal como o Inglês, não conhece mudanças ortográfias - para além do âmbito da microscopia - há centenas de anos.
Quando se fala no direito à língua, estamos a falar de um direito em construção, que incide sobre realidade complexa, com vários aspectos, mas de que um é, sem qualquer dúvida, a ortografia - passado o conceito boçal que a vê como uma transcrição fonética.
Quanto à desmesura do acordo ortográfico: é inédito na história da humanidade: seriam milhares de palavras modificadas, sem qualquer motivo que não político! Tenha-se presente que o Acordo Ortográfico do Castelhano, modificou 10 (dez) ou pouco mais palavras e, mesmo assim é meramente indicativo, por respeito para com os utilizadores! Não sejamos "modestos": a dimensão e a violência da aculturação em que se traduz este «acordo» está ao nível do que foi feito pelas grandes ditaduras.
Sem imagem de perfil

De SC a 15.10.2012 às 14:36

Vai-me desculpar, mas sendo o denominado acordo ortográfico ilegal a vários níveis, porque o aplica e qual o motivo para
não ter dito à aluna - como me parecer ser seu indeclinávle dever, ENSINAR que, em Português de lei, se escreve conjectura?
E se vier alguém falar do despacho da ministra Alçada, pode perguntar quais os pareceres que modificaram o existente, negativo, da Direcção-Geral do Ensino Básico e Secundário e em que moldes pode um despacho contrariar um decreto...
Na Alemanha nazi, os professores primários receberam ordens para dizer aos alunos que os portadores de deficiência custavam muito dinheiro ao estado, o que, em si, é uma evidência.
Houve professores que, no auge do terror nazi, se recusarem a fazê-lo.
Será preciso muita coragem para, num estado dito de direito, dizer a uma aluna como se escreve de acordo com a ortografia legalmente em vigor?
A culpa do que nos acontece não é "deles", como gostamos de dizer: a culpa é de cada um de nós. Neste caso, um pouco do Autor do post.
Nem o «acordo » está em vigor - e isto nos seus próprios termos - nem, estando, seria aplicável, por inconstitucionalidades várias.
Sem imagem de perfil

De SC a 15.10.2012 às 15:23

Desculpe os erros do comentário anterior, escrito apressadamente e com algumas emendas de que resultou terem ficado erros
Assim, peço que leia "porque o aplica e qual o motivo para não ter dito e ensinado à aluna – como me parece ser seu indeclinável dever que, em Português de lei, se escreve conjectura?"
E "Houve professores que, no auge do terror nazi, se recusaram a fazê-lo."
É interessante que Pedro equipare o produto de séculos de evolução aos arranjos políticos (sic, Casteleiro dixit) de alguns portugueses e brasileiros (a que querem sujeitar angolanos e moçambicanos!). No caso, seria sujeitar a ortografia do Português à fonética brasileira - como proclamam os brasileiros.
Sem imagem de perfil

De Pedro a 15.10.2012 às 12:40

Como é que a aluna faz para ler "especular"? E "especado"? E "bebé"? E "Queluz"?
Sem imagem de perfil

De jpt a 15.10.2012 às 12:47

A aluna nesses casos, e em tantos outros, obedece aos critérios referidos acima (explicitamente: autoridade; implicitamente: tradição, usos e costumes)
Sem imagem de perfil

De jpt a 15.10.2012 às 17:21

SC convém ter mais calma (e, em meu entender, convém assinar quando se fazem comentários, ainda para mais quando são tão assertivos). O blog tem um coluna lateral (direita) com as categorias dos temas que vamos abordando. Por razões de ordem alfabética a primeira é a "Acordo Ortográfico", tem 44 entradas, pode ser que em alguma delas possa encontrar mais sistematizado o que penso sobre a matéria. Ou seja: que é legítimo inquirir sobre a legalidade da introdução do AO no ensino. Não é certo que assim seja, mas é impossível perguntar. Quanto à alusão (proto-comparativa) com a Alemanha nazi acho-a ... descabelada. Finalmente, quanto à lição de ética e deontologia que entendeu dar-me: mais importante do que o "c" das conjecturas é mesmo compreender o que se lê. Lamentavelmente não foi o seu caso. Acontece: principalmente nos anónimos na internet

comentar postal



Bloguistas







Tags

Todos os Assuntos