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por jpt, em 13.04.04

Tomei e embrulhei.

Num comentário ao "kilo de arroz..." o meu amigo Zé Francisco dá-me uma porrada. Tomei e embrulhei...que só digo mal daí, que só digo bem daqui.

Sobre o aqui já escrevi algo mais ou menos "A árvore e o lixo". Sou emigrante, se me sentir mal vou-me embora. Os emigrantes não têm direito à crítica pública, à actividade política, à reclamação? Têm. Os explorados magrebinos, os tipos do Burkina Faso e da Serra Leoa, que atravessam o sahel sabe-se lá como, que se arriscam como boat people, e que se sobrevivem disso arrastam uma vida do caraças para que os filhos não tenham fome aí na Europa. Os refugiados afegãos, as prostitutas do caucaso, toda essa gente feita cáfila em países ricos. Têm todo o direito a criticar, a protestar, a defenderem os seus direitos.

O "patrão" acomodado no Sommerschield? O emigrante de luxo? Tenho as minhas opiniões, tenho as minhas críticas. Mas também sei que se as tenho é porque as vivo, no meio dos privilégios. Estou mal? no meio do bem-bom, então Mavalane (aeroporto internacional de maputo). Rumo ao T2 de Telheiras ou T3 de Alverca.É a minha disciplina. O meu respeito para o que me rodeia.

E é também a minha sobrevivência. Porque deixar-me mergulhar na incomensurável miséria que me rodeia é suicidário. Não o será para todos. Sê-lo-á para mim. Aqui morre-se, Zé. Morre-se como o caralho!

Hipócrita? Cobarde? Colaboracionista? Tudo isso. Sei-o bem.

O único respeito que retiro, fora do que posso fazer pela minha família. Insistir insistir para 100 tipos lá fora: saber humilde é poder! Poder fazer algo. Mas devagar também, que ser professor não é doutrinar (deontologia).E para os que aqui passam, 50-100 (?). Mais ajuda para África com outra atitude. Mais comércio com África (e isto tem que ser redito à exaustão).

Ou seja, meu amigo, e porque o grande capital [que existe e tem rosto e alma] não vai desistir amanhã: menos privilégios, menos boas consciências, para as famílias aí a norte.

Este é o meu padrão. Erróneo? Mas o único que encontrei, e chego agora aos quarenta.

Abraço, até esses restaurantes em Julho ou Setembro. Para se falar do tal bom Portugal. Existe: sete anos é muito tempo, pá. Mas:

há o Lobo Antunes, mas não vou escrever sobre isso - não sou crítico literário.há o João Magueijo, ando a lê-lo - mas achas que percebo aquilo tão bem que o possa escrever?há o Siza Vieira - mas e as torres que já não são do Abecassis?, e os nossos Mateus, ok, mas nem conheço o que fazemhá o Porto - que é grande empresa, e disse-ohá as melhorias aí - vê o último apontamento.

Mas sete anos são muito tempo. Para a paixão, para o pormenor que serve de indução. Para os amigos. Fica a imagem cá de longe. E, desculpa, um enorme fastio com o que cá chega. Pela comunicação. Por avião.

PS: e já agora Zé, e isto tu não podes perceber porque nunca o viveste, há algo abaixo de Tânger que nos faz mal, que nos envenena, que nos torna a nós portugueses em piores. Chama-se paternalismo. Que, felizmente, muitos perdem quando aqui vivem. Mas que quando é só visita vem em estado bruto. E cansa tanto...

Parafraseando o outro o paternalismo é a doença infantil do racismo. Não tenho paciência! E digo-te, sem falar em nome de ninguém, não têm paciência. Os nossos patrícios e os "donos da terra".

Abraço grande

publicado às 21:53

Eleições presidenciais

por jpt, em 13.04.04

Em alturas de Abril, de trinta anos de democracia no meu país, venho lembrar um aspecto anti-democrático do sistema político que vigorou até há pouco. (1) Por um lado para lembrar a tantos escatológicos do país que a democracia se vai enriquecendo, e esta mudança é um clarissimo sinal disso. (2) Por outro para fazer uma declaração antecipada de voto.

(1) Desde Abril durante décadas violou-se o princípio de igualdade de cidadania, uma prática anti-democrática devida a (afinal infundadas) querelas partidárias: os emigrantes não tinham direito a voto nas eleições presidenciais. Felizmente isso terminou, mas é bom não o esquecer para não mitificar os sentimentos democráticos, para se perceber quais os, por vezes ímpios, caminhos a que a partidocracia pode descer. E também é bom não o esquecer para se perceber que, afinal, a democracia vai melhorando, como é de sua essência, e que os discursos catastrofistas não têm sentido que não seja o da pequena estratégia.

(2) E já que os emigrantes podem votar anuncio aqui o meu voto. Tenho por Pedro Santana Lopes o imenso respeito devido a quem foi presidente do Sporting Clube de Portugal. Ainda que o não coloque no altissimo patamar devido ao Senhor João Rocha ou ao Dr. José Roquette.

Toda a imprensa o aponta como presumível candidato às futuras eleições. E a própria retórica de PSL o indica.

Votei no PSD nas duas últimas eleições legislativas.

Li no Expresso que

"A transferência do actual hipódromo do Campo Grande para o «pulmão de Lisboa», que está a ser negociada com a Câmara, visará desafectar aquela área da capital para projectos urbanísticos. Recorde-se que, nos últimos anos, o Parque de Monsanto tem vindo a servir de moeda de troca para investimentos imobiliários, dando abrigo a instalações localizadas na cidade e deixando áreas livres para a construção civil. Assim, está em curso a instalação da Feira Popular dentro do perímetro florestal, depois dos cortes praticados pela CRIL, pela construção do pólo universitário ou pelos «avanços» de condomínios privados, como a Quinta de Santo António, em Caselas."

Assim venho aqui afirmar, ajuramentado, que caso o dr. Pedro Santana Lopes se candidatar nas próximas eleições presidenciais votarei em qualquer outro candidato. Seja ele quem for.

Até mesmo no eng. António Guterres.

publicado às 09:25

Cônjuges presidenciais

por jpt, em 13.04.04

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Em alturas de Abril comemora-se a democracia em Portugal. Lembra-se o péssimo anterior (que muitos querem reduzir e alguns negar). E elogia-se o bem posterior. E há muito para elogiar, apesar do que se possa criticar. Em alturas de Abril, quero chamar a atenção para dois aspectos anti-democráticos do exercício do sistema político. Que as efemérides sirvam para lembrar e melhorar. O primeiro actual; o segundo histórico, felizmente já passado e que abordarei, interesseiramente, no próximo apontamento.

O actual é um que trai a República, provável que inconstitucional, decerto que imoral: a existência de uma chamada "primeira-dama", com direito a gabinete e a colaboradores, e de quem se espera e aceita uma actividade pública enquanto tal. Deslize monárquico, mas não sobrevivência - gostaria de ver alguém conhecedor escrever sobre as "primeiras-damas" da I República para poder sedimentar esta ideia de uma posterior, e muito contemporânea, reconstrução subreptícia de um ideal de "família presidencial". Ou seja, não se trata de uma mera continuidade da imagem do casal real, é um recurso "monarquizante" devido, muito provavelmente, às pressões do marketing político e a influências externas (First Lady americana como paradigma?).

Nunca nada me moveu contra as Senhoras cônjuges dos Presidentes da República. Mas não lhes posso aceitar nenhum papel público enquanto tal. Como cidadãs sim. Mas nunca como mulheres de (Senhoras de ...). 

Dir-se-á que têm obrigações de representação. Não é nada de natural, é uma opção política. Mas até a aceito. E também que se gaste muito e bom dinheiro com a sua representação.* Mas nada mais. Nenhum outro papel se lhes poderá aceitar. Na República vota-se num cidadão para exercer funções. Apenas isso - e é um enorme, respeitadissimo e, lembre-se em alturas de efemérides políticas, conquistado "Apenas"! Tudo o resto são desvios, graves, à lógica, à moral, à ideologia republicana.

Ainda mais me espanta a cega aceitação de que as Senhoras cônjuges dos Presidentes tenham particular atenção e acção pública em áreas determinadas: a saúde materno-infantil, os desvalidos, a segurança social, o apoio aos idosos, as catástrofes, a educação básica e, aggiornamento óbvio, as minorias étnicas. E, claro, as modas e bordados, perdão, a moda. Mas na sua (ilegítima, repito) acção nunca surgem elas ligadas à investigação científica, aos mineiros, à questão das pescas, ao desporto de alta competição, à indústria, à reforma da administração pública e eníssimos etcs.

Ou seja, no seu (ilegítimo, birrepito) papel as Senhoras cônjuges dos Presidentes nada mais fazem do que repetir a velha divisão sexual de trabalho, as dicotomias de género da família burguesa de XIX-XX: o doméstico, a socialização das crianças, os desvalidos, os doentes e idosos.

Esta é já uma dimensão sobrevivência que uma sociedade em franca transformação das relações de género assiste complacente. E nenhum(a) paladina dos fervores feministas surge reclamando contra este vero folclore. O que me não me espanta. Mas diverte, pois atento ao folclorismo maximalista dessa mole tonitruante.

Para os trinta anos de exercício democrático da República bem que se poderia romper com este atavismo de género. Mas mais do que tudo romper com esta traição ao ideal republicano.

* Li algures que é costume os costureiros portugueses emprestarem vestidos às cônjuges dos presidentes (ou pelo menos deste último: o qual muito prezo, e de quem sou eleitor, para que não se pense que há aqui qualquer ataque pessoal). Que tal acontece principalmente aquando de visitas ao estrangeiro, para divulgação da moda portuguesa. Não sei se isto é verdade. Li e espero que não seja. Porque seria semelhante ao Presidente andar a pedir roupa emprestada nos alfaiates. Ou usar t-shirts da Sumol ou Super-Bock para defesa da indústria portuguesa.

Portanto decido-me, dogmático. O que li é mentira! Se não for, pague-se, pague-se o que for preciso para que a representação do casal presidencial seja o melhor possível. Mas não os usem, nunca, para publicidade empresarial. Qualquer que seja ela.

publicado às 09:24


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