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O Papa e os Preservativos

por jpt, em 20.11.10

(Bento XVI em Angola)

Há um ano o Papa Bento XVI visitou países africanos e muito mal falou sobre o Sida e os preservativos. Muito mal pois fez tábua rasa sobre os contextos interpretativos das suas palavras, ao sublinhar (mesmo que em contexto relativamente privado) a oposição da igreja católica ao uso do preservativo. As críticas sucederam-se, por parte dos anticristos do costume. E a defesa arreigada do Papa (da sua infalibilidade?) apareceu até de gente de de quem se esperaria melhor entendimento. Lembro, em contexto português, a excelência da posição de António Lobo Xavier, bem acima dos trogloditas topológicos que apenas querem berrar.

Agora o Papa refere a relativa aceitabilidade do uso dos preservativos. Que não são a solução, mas que em que alguns casos poderão e deverão ser utilizados face à doença. Era isso que então se pedia. Ponderação na utilização da palavra e compreensão quanto aos contextos da sua interpretação. Ponderação na filiação a alguns valores, que não serão os centrais da igreja. Uma coisa são os fundamentalistas irracionais que querem que a igreja católica se negue a propósito do sida (ou de qualquer outra coisa), outra será a expectativa daqueles (crentes ou não) que desejam a influente igreja católica colaborante de modo abrangente na luta contra as concepções e as práticas que fazem propagar a maldita praga.

Esta declaração papal levantando o ónus radical da utilização dos preservativos é um momento histórico (e não sendo nada especialista, acredito até que o é na história da igreja católica). Um passo importante na prevenção do sida . Que seja divulgada - e não só no seio dos católicos, já então referi o peso (até simbólico) das palavras do Papa no seio de outras confissões religiosas.

Adenda: o PPM transcreve (e em versão portuguesa) as declarações de Bento XVI sobre a utilização de preservativos. Independentemente de outro tipo de discussões quando as lemos só as podemos saudar, pensando em tantos contextos africanos onde o preservativo é considerado seja um pecado seja como arma de disseminação do sida (é necessário lembrar que parte do próprio clero católico reproduz a ideia de que o sida é invenção europeia para exterminar africanos e ocupar a terra; é necessário lembrar a crença, recorrente, de que a lubrificação dos preservativos é o agente letal de infecção). Isto tanto em contextos católicos como em cristãos como de outras confissões religiosas.

jpt

publicado às 22:33


11 comentários

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De cg a 21.11.2010 às 01:16

é isso mesmo: ponderação. sem banzé "pra sair na foto".

mas a ICR (todas...), tão lentinha que é quando se põe "a ponderar"...
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De VA a 21.11.2010 às 14:52

Momento histórico, sem dúvida...e o que isso trará de libertador para os jovens acólitos...a longo prazo, claro! :)
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De VA a 21.11.2010 às 20:13

eh pá, não era piada, era pura convicção...nunca mais coloco sorrisos nisto!!! Ontem vi a notícia na TV e até achei curioso o facto da comunicação não ter sido empolada.
É sem dúvida um momento historico, por isso não embirres, sff. Hoje estou com os dedos em "sangue" (não, não foi a/o jugular)de tanto teclar, por isso não me faças responder em lençol. Ah! E sou bairrista, mas sem cloaca.
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De VA a 23.11.2010 às 12:29

Agradeço porque eu é mais teatro, mas aventurei-me a estender o lençol...coisa rara no Ma-schamba...enfim, era mais ou menos isso...um pouco mais do menos. :)
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De jpt a 21.11.2010 às 19:49

VA o piadismo bairro alto, do caixote do lixo bloco de esquerda, não te veste nada bem. Do pouco que conheci pareces-me com mais andamento passado e futuro do que a cloaca jugular-louçanista que abunda em lisboa. Arriba acima, sff.
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De FF a 23.11.2010 às 02:10

Saúdo calorosamente o actual Papa por ter tomado esta posição, apesar de ainda um pouco tímida e se calhar ambígua, mas uma clara inversão no discurso da igreja católica apostólica romana. Saúdo, sobretudo, porque pode ser mais uma "voz construtiva e activa" numa estratégia global de combate ao flagelo mundial do HIV/Sida. E, muito provavelmente uma "voz" profundamente até mais útil em contextos continentais que não o africano, nomeadamente na América Latina. Claro, em África também. Onde às más práticas das igrejas (algumas, e em certos casos), e às más práticas das ongs (algumas e em certos casos), se junta também as más práticas sexuais (algumas e em certos casos)das próprias populações, e muito concretamente de certas franjas sociais, provavelmente da juventude urbanizada ou semi-urbanizada. É mais uma "voz", que se pode agregar,e por isso saúdo a sua chegada. Mas também não vale tomar exageros, em África a igreja católica, na sua versão apostólica romana, não é assim uma força tão impositiva e reformuladora das práticas e das concepções como amiúde queremos acreditar (por posições pró ou contra), nem mesmo até as outras confissões católicas. Talvez só mesmo no Ruanda e no Burundi é que estas igrejas, nomeadamente a primeira, têm historicamente um impacto significativo na generalidade das práticas e representações das populações, de resto é muito mais as vozes, que as nozes. Já o mesmo não se pode dizer do islão. Desse, confesso que nada sei no caso do combate ou não ao HIV/sida, mas também não ouço nada dizer. Já agora talvez mesmo o mais acertado é tentar perceber porque é que falham as estratégias sobre o uso do preservativo (e não é concerteza, globalmente, porque a igreja católica AR era contra). Já agora também não se usem explicações meramente culturalistas do tipo "não faz sentido tradicionalmente aos africanos", pois aos europeus (só a título de exemplo) também não faz sentido (nem tradicionalmente nem modernamente) e, como demonstram imensos estudos, por estas bandas também não abundam as "boas práticas sexuais" e, nomeadamente o uso do dito latex. Apesar das inúmeras variedades tecnológicas do dito.
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De VA a 23.11.2010 às 09:51

Obrigada,FF.
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De AL a 21.11.2010 às 22:22

Fiquei estupefacta; nunca pensei ouvir tal declaracao ainda no meu tempo de vida. E estupefacta estou tambem com as sangrias jugulares. De facto, a fe e' mesmo cega - seja ela religiosa ou de cariz contrario
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De VA a 22.11.2010 às 00:31

Não consegui chegar às sangrias jugulares sobre a questão. De qualquer forma gostaria só de acrescentar que Sua Santidade esteve bem dentro da sua perspectiva sobre o problema. Mas há algo a acrescentar.
Primeiro, é necessário que se perceba que os africanos não possuem "más práticas" - como tanta vezes as missões católicas no terreno se encarregam de enfatizar - que contribuem para a propagação da doença.
Segundo,é necessário que a prevenção do HIV/SIDA deixe de ser um negócio de marketing em África. Há que chegar às populações quanto há prevenção, mas parece-me que distribuir pins aos camponeses de Cabo Delgado em nada contribuirá para a solução do problema, quando muito contribui para a estatística que as ONG's posteriormente apresentam como trabalho realizado. Também distribuir panfletos especificamente aos mineiros porque se apresentam como grupo de risco, faz com que se acentuem discriminações entre grupos.
Terceiro, há que ter em atenção a perversidade da distribuição de preservativos e das campanhas de sensibilização. Distribuem-se preservativos gratuitamente durante uma semana e depois passam a ser vendidos. Ora, em populações que se debatem com a sobrivência do dia-a-dia, comprar preservativos não é certamente uma prioridade.
Por último, os preservativos para distribuição e venda são de péssima qualidade e sem lubrificação. Rompem a meio do acto sexual em nada contribuindo para um eficaz método preventivo.
Ora se as missões católicas, apostólicas e romanas se deixassem de tretas e não entrassem em conluio com as ONG's (que não conseguem uma boa qualidade de preservativos para distribuição - pois! são caros) e não fomentassem crenças absurdas, parece-me que metade do problema estava resolvido.
Boa noite, meus caros...
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De jpt a 22.11.2010 às 02:37

A primeira coisa que gostaria de referir é que não há tal coisa como "africanos" no sentido de universo homogéneo.
Quanto às sangrias jugulares é fácil encontrar, é o lisboetocentrismo bloco ou gangster, que de tudo fala para falar sobre si mesmo. Quando se trata de falar de sida tem o avatar de se prender nos complexos da sua relação com a igreja católica e de não serem tão bons católicos como os paizinhos que até foram (ou gostariam de ter ido) à capela do rato, in illo tempore. Basta ires ao jugular e seus avatares que encontrarás essa mescla de furibundismo anti-clerical com imbecilidade desonesta amais crueldade (na prática é um discurso que se está cagando nos doentes, só lhes interessam os seus orgasmos retóricos)

Quanto ao teu comentário, VA, a escorregar para dentro do caldeirão do impensamento típico de la "belle gauche lisboéte", desculpa a franqueza. Começa pelo correctismo, no sentido em que nega a existência de más práticas. Há uma doença, que se evita metendo a pila dentro de latex. A doença é mortal (na prática pode não o ser mas exigirá um grande tratamento) e é transmissível. Hã imensa gente doente. Há uma má prática que é o de não meter a pila no latex e a andar a metê-la nas vaginas, bocas e rabos alheios. Essa má prática é, por razões múltiplas, mais frequente no continente africano (onde há mais doentes) do que noutras regiões. Normalmente o correctismo (e o catolicocentrismo) vai desaparecendo à medida que se vão conhecendo pessoas que morrem e se percebe que a questão não é exactamente dizer mal do senhor cardeal de lisboa ou chamar ratzinger ao papa.

Depois há o típico catolicocentrismo, notório de quem vem das paróquias lisboetas (ou perirubanas), a resmungar com as missões em África porque não fazem o suficiente pelos pobres pretinhos (que não têm, não se vá dizer isso, más práticas, apenas enfim precisam da ajuda dos "irmãos") Ora na panóplia de missões cristãs acho piada nos gemidos da burguesia lisboeta sempre pronta a resmungar contra a igreja católica mas sempre a esquecer-se da pluralidade de igrejas que estão por aí. Conviria lembrar, pelo menos (pelo menos), que parece que em 1517 ou assim parecido houve um tipo alemão que espetou um papel ou coisa parecida na porta de uma igreja ou coisa parecida. Mas claro os fugitivos da catequese nunca, mas nunca mesmo, se lembram disso. Na prática isto provém da hermenêutica turista que praticam (convém nunca esquecerem que adoptam como referências intelectuais engenheiros que não o são ou historiadores que dizem que Portugal é o primeiro povo a terminar com a pena da morte - da escória esquerdista lisboeta não se deve pois aceitar influências quando se trata de pensar, por mais que isso signifique afrontar a centralidade da (afinal) Santa Madre).

Finalmente, e evitando falar sobre a indústria do sida, que aqui aparece como se filiada à santa madre igreja (outra vez o catolicocentrismo, que deve agitar de contentamento o ainda assim castigador sacristão do ma-schamba), ela também vista como omnipresente na articulação com as romanas ongs (sim, aqui também há algum lusofoniaocentrismo, mas só para rir ver como sobrevalorizas a aliança catolicismo e ongs) permito-me sempre, diante dos furores anti-políticas vs sida em áfrica, e de como elas são más e ineficientes, questionar-me sobre como seria se elas inexistissem? Os pins no Cabo Delgado? Viste-os, estiveste lá? Mas mais do que isso, a indústria do sida depende ou articula preferencialmente com a igreja católica ou suas emanações? [e logo no Cabo delgado?] Resposta minha - não. E portanto espetar isso aqui, ainda para mais numa abordagem muito discutível e assente num determinado tipo de abordagem, quando se fala da igreja católica é pura demagogia. Voluntária? ou, como me parece, um deslize demagógico proveniente do muito já referido catolicocentrismo.

(esse mesmo que muitas extremas-unções irá provocar entre os furibundos e as furibundas do hoje em dia.)

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