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Olhar academicus sobre o bloguismo

por jpt, em 06.02.11

O Ouri Pota Chapata Pacamutondo tem o Mãos de Moçambique, um bom blog moçambicano, virado para as coisas da mente. Jornalista e académico, o Ouri Pota não tem só um blog, é mesmo bloguista e nisso lê outros blogs, avisa de novos blogs, faz ligações - tenho a agradecer-lhe um já antigo companheirismo feito em indicações para o PNETMoçambique e antes no ma-blog, para além daquelas saudáveis cumplicidades que se estabelecem entre bloguistas que olham para coisas similares.

Tive agora o prazer de o conhecer pessoalmente. Veio cá a casa para uma conversa sobre bloguismo, no âmbito de um projecto da responsabilidade da Universidade do Minho, do qual ele é um dos colaboradores aqui. Trata-se da análise de blogs em Portugal, Brasil e Moçambique. Se a conversa lhe foi útil não o sei, mas foi-me agradável, conhecê-lo e falar sobre blogs em Moçambique e não só.

Mas ficaram-me duas coisas inditas, que agora deixo. Sei que apareço normativo, mas ainda assim vou deixá-las. A primeira é sobre o bloguismo e como o olhar (analisar). A piada do bloguismo, desde que apareceu, foi ser um espaço de opinião pública aparentemente deshierarquizado, não filtrado (ou seja, não "disciplinado") e no qual não contavam as hierarquias trazidas de fora, estatutárias e profissionais. As relações entre-blogs tendiam a não ser piramidais, ainda que as estratégias de conquista de audiências levasse a interacções inigualitárias, e nisto centro-me no caso do bloguismo português, em particular o politicamente orientado (mas também o de aspirações literatas). Em Moçambique o caso foi algo diverso, quantitativamente menor e mais circunscrito a um contexto académico (e, depois, mediático), as hierarquias vieram para o bloguismo e foram-se esbatendo (e neste caso com a importância do Machado da Graça a abrir o Ideias para Debate, espaço aberto). Ou seja aqui foi no bloguismo, na sua prática, - e também por influência do agitado mundo dos debates in-chat - que as hierarquias estatutárias externas foram sendo abandonadas.

Por isso mesmo muito desconfio da capacidade analítica sobre o bloguismo de bloguistas que tenham uma opinião hierárquica e hierática do mundo bloguista. Um caso típico disso é a incapacidade de publicitar (já nem falo de colaborar) nos agregadores, associada à utilização da "ligação/divulgação" [o elo, que o anafalbetismo funcional denomina "link"] (parcimoniosa) de blogs alheios como uma recompensa a quem "merece" (na prática não sendo mais do que um sinal de auto-distinção). No fundo a utilização do bloguismo para tentar reproduzir um pretenso estatuto exo-bloguista não me parece transportar a perspicácia suficiente para ler este processo comunicativo - e já nem falo das minudências ridículas das retiradas de ligações, e coisas assim, como vingançazinhas de debates exógenos. Sem esquivas, passamos anos a avisar os alunos de ciências sociais dos "obstáculos" ao "pensamento analítico", esses etnocentrismo, sociocentrismo, até anacronismo. E não denunciamos como incompetente o egocentrismo, esse menear das primas donas. O "primadonismo" é a "doença infantil" da análise social.

O bom do Ouri Pota, que não é minimamente o objecto desta minha reflexão, perguntou-me ainda (o guião, presumo, é minhoto) sobre o que pensava eu da minha actividade bloguista como construtora da lusofonia. Engasguei-me claro. Já aqui muito escrevi sobre a lusofonia e não me apetecia repetir, ainda que em versão digest. Pedi um off the record ao Ouri Pota, no intuito de não vir a desagradar à Universidade do Minho, decerto ilustrada e educada, e disse-lhe da minha opinião: "a lusofonia, como conceito, é boa para limpar o cu". Passados uns dias arrependi-me e escrevi-lhe pedindo um in the record. Que os responsáveis da análise possam, se o Ouri Pota entender transcrever essa parte no seu relatório, levar com a minha opinião.

Já agora, não percebo uma coisa. Será de analisar um fenómeno social (o bloguismo) presumindo que ele produz algo (a tal lusofonia) - e como tal andar a perguntar aos indivíduos se o produzem - ou será de analisar um fenómeno social procurando o que ele produzirá (porventura a tal lusofonia)? Ou por outra forma, postulamos os conceitos na realidade ou procuramos que conceitos são produzidos e vividos no real?

Mas enfim, há que ter subsídios do Estado. Eu julguei é que o Estado (patrício, entenda-se) já estava "noutra".

jpt

publicado às 21:10


1 comentário

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De VA a 06.02.2011 às 23:13

Não,JPT. O Estado patrício ainda não ultrapassou a lusofonia, o multiculturalismo, o interculturalismo para finalmente chegar ao "liberalismo musculado" de James Cameron...é que o Reino Unido está muito à frente...

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