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Coisas da Colômbia do Norte

por AL, em 23.10.14

Pois o sítio onde estou é muito lindo ah poizé!, com árvores enormes que se chamam áceres (mas aqui sem xarope que não faz frio suficiente), pinheiros e cedros e quase tão grandes como as sequoias que vi em Oregon quando lá estive. Para onde quer que me vire, vejo árvores, riachos, musgo, praia, mar... De lá de baixo da praia e da varanda aqui da cabana vêem-se algumas das montanhas das Rocky Mountains e nos dias melhores consegue ver-se o pico nevado de Mount Baker que fica a centenas de quilómetros daqui. Ópraiele aqui:

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Tirando a vegetação, muita coisa aqui me lembra África, se é que posso incluir assim neste genérico a diversidade de países que compõem o continente. Mas fiquemos por aqui e deixem-me dizer África. Temos árvores dos antepassados – a minha vizinha do lado, que é uma querida e que tem “boa pessoa” escrito na cara, vai ocasionalmente falar com a avó dela que já morreu há muitos anos e que encarnou numa árvore grande ali em baixo ao pé do riacho. E há outros como ela, com árvores-marido, árvores-filha, etc, que parece que as árvores aqui não são esquisitas em relações familiares. Quando lhes falei na árvore dos antepassados lá em Moçambique, disseram “que exótico” e começaram a falar de coisas que viram no National Geographic. (facepalm, facepalm!)

 

As pessoas aqui quando estão doentes também vão primeiro ao curandeiro e só depois é que vão ao médico, se forem! Mas os curandeiros aqui não se chamam assim, chamam-se técnicos de reiki, terapeuta craniossacral (não perguntem que não faço ideia do que seja e quando ouvi pela primeira vez mencionado aqui julguei que era um bolo), naturopatas, xamãs, homeopatetas e outros nomes que não sei dizer bem. Depois vão para casa e fazem poções com açafrão das índias e gengibre e outras plantas e raízes que não sei o nome, que são raladas, maceradas, descascadas, pulverizadas e deixam um cheiro e um sabor horríveis mas que parece que são melhores que qualquer xarope das farmácias. Se depois de muita mezinha e muita terapia a coisa não melhorar, então lá fazem o favor de ir ao hospital onde geralmente acabam por ficar alguns dias devido à gravidade da situação. (Juro que não estou a inventar, aconteceu no outro dia com o vizinho que mora ali mais abaixo do carreiro que vem dar à nossa cabana e com a vizinha boa pessoa há uns meses, contou-nos ela)

Aqui também fazem rituais, mas chamam-lhes bênção das águas, cerimónia da lua cheia e outro nome que não sei dizer e que cheguei a pensar que era uma sauna mas afinal não era e também incluem danças e tambores. E gente num círculo e lume nas pedras e todos a dizerem ommmmmm.

 

A coisa onde isto é muito diferente de África é que aqui as pessoas em vez de terem filhos, têm animais. E depois têm tudo igual como e fosse para os filhos: têm um grupo para convívio dos cães que se reúne todos os dias lá em baixo no pomar orgânico (que tem umas maçãs tão raquíticas que eu pensava que eram ameixas pequenas) para os cães brincarem com os amiguinhos. Levam os cães e os brinquedos deles e depois podem trocar e levar emprestado e assim. Enquanto os cães brincam, os “pais” (são eles que dizem, os donos, não sou eu) debatem se devem deixar ou não os canitos verem televisão por causa do consumerismo (ouvi eu com estes que a terra há-de comer) e combinaram ontem quais os “treats” que iriam ter para os canitos no Halloween. Parece que manda a tradição aqui que se vistam os cães e se vá de casa em casa fazer o trick or treat. Discutem os problemas psicológicos dos animais e qual o melhor curandeiro para a ansiedade do Bobby ou o eczema da Lulu. Ou um dentista para a Suki que está a ficar velha e não consegue roer bem a carne. Que os cães comem, mas que os donos (ou os “pais”) geralmente não comem porque são contra a crueldade com os animais (mas, há alguém a favor?) e só é crueldade para a vaca (ou galinha) morta  se for para nós humanos comermos, mas se forem os cães não faz mal, deixou de ser crueldade. Também parece que afinal semi-domesticar um animal selvagem não é crueldade nem é nada muito grave e por isso os vizinhos espalham ração nos terrenos para os veados virem até nós (já que não há criancinhas...).

 

Portanto, dizia eu, que o sítio onde estou é muito lindo, o ar muito puro, o silêncio ideal para trabalho (que tenho feito afincadamente). Felizmente tenho imenso trabalho para me distrair. Sim, porque foi preciso vir aqui para perceber que esta coisa da natureza para mim é como o inverno – é bom durante uma semana ou duas e depois cansa. E agora vou ali num instante cheirar o escape de um automóvel que estou à beira de uma overdose de clorofila.

AL

publicado às 17:34



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