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Morreu Pancho Miranda Guedes

por jpt, em 07.11.15

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 ["Templo decadente", escultura em madeira, 1968]

 

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[Casa do Dragão, fotografia de Mike & Minette Bell]

 

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[Restaurante Zambi, fotografia de  Mike & Minette Bell]

 

Morreu hoje Pancho Miranda Guedes. Forma de homenagem ao até mítico "arquitecto de Lourenço Marques", do pigmalião de Malangatana? Ler este profundo texto de Alexandre Pomar. Acompanhando-o com este filme.

 

 

A Procura De Pancho from ArchitectureZA on Vimeo.

 

E depois?

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Quem estiver em Maputo trata-se de retirar da estante este guia "112 Edifícios de Pancho Guedes em Maputo. Lista e Localização", um roteiro então produzido e oferecido pelo consulado-geral de Portugal, aquando da sua condução pela mais do que estimável diplomata Graça Gonçalves Pereira - que, na prática, foi também sua pesquisadora e autora -, que contém mapa e identificação nominal, com respectivo endereço, da obra do arquitecto nesta cidade.

 

Entretanto? Ao longo dos anos coloquei no blog alguns postais sobre o arquitecto. Nele incluí várias ligações a sítios a ele dedicados - infelizmente na sua esmagadora maioria estão descontinuados. Espero que rapidamente sejam substituídos por arquivos digitais de livre acesso - será a maior homenagem ao grande arquitecto. E não seria mal pensado que o Conselho Municipal de Maputo congregasse as faculdades de arquitectura do país e organizasse uma bela homenagem, forma de pensar inspiradamente uma arquitectura em Moçambique.

 

E transcrevo um postal que coloqui há cinco anos, por ocasião de uma visita do arquitecto a Moçambique, citando um excerto da entrevista que concedeu ao importante investigador Uli Beier:

 

 

 [Pancho Guedes. Vitruvius Mozambicanus, Museu Colecção Berardo, 2009]

 

"Ulli Beier: Quantos edifícios construíu em Lourenço MarquesPancho Guedes: Não sei, ainda estou a organizar o meu arquivo. Parece que há trezentos ou quatrocentos edifícios em Moçambique. (...) mas ao todo desenhei mais de seiscentos, talvez setecentos edifícios." (23-24) Olhá-lo não deverá ser num sentido museológico, conservacionista que seja, e ele próprio sabe-o: "A maior parte das minhas obras está agora morta ou ferida, vítima de acidentes e revoluções." (31). Pelo contrário olhar a sua obra é, para arquitectos porventura mas com toda a certeza para cidadãos, uma aprendizagem das exigências, do que é a exigência de quem vive, agora que, e não só em Maputo, "Em toda a parte as cidades estão a perder as suas personalidades e começam a parecer-se umas com as outras, quase como os aeroportos. Não é através de regras, dogmas, ditames, piruetas ou assassinatos que a cidade será devolvida aos seus cidadãos. Só através do poder da imaginação a cidade se tornará maravilhosa." (75) Uma imaginação que terá que ser um questionamento: o do grão-edifício padronizado - cuja inevitabilidade/obrigatoriedade a sociedade urbana moçambicana parece aceitar sem angústia e, até, com orgulho, altaneira e com indiferença diante de "edifícios propositadamente estranhos, que têm a qualidade das aparições. Há algo de extraordinários neles, são desiquilibrados ..." (20); o da planeamento "racionalista" - "Quando voltei a Lourenço Marques em 1950 (...) a câmara tinha imposto um plano à cidade propriamente dita, através do qual, à autoritária maneira pombalina tentava determinar a título definitivo o que poderia vir a ser construído em cada local. Felizmente, Fernando Mesquita, um conselheiro municipal iluminado, desenvolveu algumas alternativas dissidentes das quais beneficiei..." (75); e o da arrogância sociológica - "... os urbanistas seguintes ... foram, na sua maioria, indiferentes ao que se passava no caniço." (75).

 

Ler (e ver) Miranda Guedes é aprender também a como a tal "cidade maravilhosa" imaginada na prática se faz não na manutenção de uma qualquer "identidade" pré-determinada, em purismos sempre legitimados pelo sufixo "idade". Sabê-la como produzida, imaginada na mistura, arrojada mas nunca auto-complacente, de referências. A tal imaginação, o tal arrojo, não como um acantonamento, sim como uma viagem: "Ulli Beier: E quando começou a fazer o tipo de edifícios a que chama Stiloguedes? Pancho Guedes: Logo no início. (...) Ulli Beier: Quando desenha edifícios que têm esses elementos estranhos, como chega até eles? (...) A imagem surge primeiro, então? Pancho Guedes: A imagem - não sei de onde vem. Neste caso em particular, chamei-lhes dedos, picos. Será uma reinterpretação de um edifício que sempre teve importância para mim? É uma casa em Lisboa, a Casa dos Bicos, que picos piramidais em toda a fachada e arcos góticos. Quase toda a superfície da parede tem estas pirâmidade salientes, em ângulos rectos. Lembro-me desta casa de quando era pequeno, e vou vê-la sempre que volto a Portugal." (20-21-22). Enfim, conjugar para além do óbvio. Do grande. E do "cimento". E é nisso que radica a "ident - idade".

 

Deixo as imagens. Para um "quem diria?!" que venha a ser "dizer que".

 

["A Ribeira Velha antes de 1755", a Casa dos Bicos é o segundo edifício desde a esquerda, com a forma aproximada da actual]

 

["Fachada da rua dos Bacalhoeiros, primeira metade do séc. XX"]

 

 

 

 

publicado às 18:33



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