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Diário da Guerra dos Porcos

por jpt, em 22.08.07

Um dos rapazes estava a explicar-me … - disse Vidal. - Aquele das borbulhas? - Não, o mais novo, aquele com ar de bagre. - Tanto faz.- Explicava-me que, por trás desta guerra ao porco, há boas razões. - Falaram do crescimento da população e de que o número de velhos inúteis está sempre a aumentar. - As pessoas matam por estupidez ou por medo. - No entanto o problema dos velhos inúteis não é uma fantasia. Lembra-te da mãe de Antónia, a senhora a quem chamam Soldadote. Arévalo não o ouvi; num tom monocórdico, declarou:-  Nesta guerra, os miúdos por ódio contra o velho que vão ser. Um ódio bastante assustado ... (118) 


Enquanto o seguia pelo corredor, Vidal comentou: - Arévalo estava a dizer-me, doutor, que esta guerra é um fenómeno que está a acabar. - Creia-me – respondeu o médico, sacudindo tristemente a cabeça: - o serviço de psiquiatria não é suficiente para atender os jovens. Todos lá vão por causa do mesmo problema: apreensão de tocar nos velhos. Uma verdadeira repulsa. - Asco? Parece-me natural. - A mão recusa-se, meu caro senhor. Há um facto novo irrefutável: a identificação dos novos com os velhos. Através desta guerra, eles entenderam de uma maneira íntima, dolorosa, que todos os velhos são o futuro de um jovem. Deles próprios, talvez! Outro facto curioso: invariavelmente o jovem elabora a seguinte fantasia; matar o velho equivale a suicidar-se.” (203)


Adolfo Bioy Casares, Diário da Guerra dos Porcos, Cavalo de Ferro, 2006 (1969), (traducao de Sofia de Castro Rodrigues e Virgílio Tenreiro Viseu)

publicado às 23:32


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