Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]
"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
E logo me recordo das palavras introdutórias ao seu esplêndido "A Piedade e a Forca", que sempre me acompanham, vivendo como vivo num país subjugado ao calão do Banco Mundial, feito mito omnipresente (e dito omnisciente) da Luta Contra a Pobreza Absoluta, o constante PARPA. Não diz só isto, na sua história da utilização do termo "pobreza". Mas assim é inultrapassável:
"Na Europa do século XIX ainda encontramos em certa literatura polemística e no pensamento social uma visão da pobreza como uma "doença vergonhosa" da sociedade moderna que urge debelar por meios novos. Concomitantemente, porém, assiste-se a uma gradual reformulação da abordagem conceptual das análises sociais e do estilo do discurso ideológico. A crise dos programas filantrópicos, o despertar da consciência social das masas e as mutações nas estruturas da vida política fazem com que seja praticamente eliminado da linguagem económica e social o termo "pobreza" (e "miséria"): porque carrega um sentido subjacente de piedade, apresenta-se como um juízo de valor que confere uma atitude de superioridade ao que o emprega. Essa carga semântica emotiva torna-o demasiado ambíguo para servir de instrumento de reflexão e, portanto, pouco operacional nas investigações da ciências sociais. Todavia, quando se estuda o fenómeno nos seus aspectos históricos (...) assiste-se igualmente ao acentuar da tendência para enquadrar a questão da miséria no âmbito (...) da análise das causas das desigualdades sociais e da repartição do rendimento nacional vem substituir a tradicional problemática da pobreza."
[Bronislaw Gemerek, A Piedade e a Forca. História da Miséria e da Caridade na Europa, Lisboa, Terramar, 1995 [1986], tradução de Maria da Assunção Santos]