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Há algumas semanas quando Eduardo White morreu escrevi um texto sobre ele (que se calhar deveria ter escrito quando ele em vida), sobre a aventura que foi a edição de um livro por ele organizado "Rostos da Língua. Breve Antologia de Autores de Língua Portuguesa".

 

Escrevi-o com os meus livros já empacotados, encerrados num contentor, tal como o meu computador imóvel, ali esperando uma travessia transoceânica. Ou seja, as imagens e fotos que vim digitalizando. Portanto procurei na internet uma imagem da capa do livro, para encimar o texto, e não a encontrei: o que demonstra bem o menosprezo (para não dizer pior) do Instituto Camões por uma edição sua (ainda que a chancela fosse, então, tripla). Nem lhe digitalizou a capa, nem o terá distribuído de forma a alguém o fazer - e nem vou recordar as microdicências que a este propósito ouvi dos então responsáveis daquela instituição. Adiante, descobri agora a imagem da capa do "Rostos de Língua" num álbum que fiz para o facebook, "livros relacionados com Moçambique", uma coisa mais ou menos insana, maníaca, onde vou juntando centenas de capas de livros que fui lendo ao longo dos anos.

 

Capa para o qual o Eduardo exigiu a presença da pintura do Naguib. Está aí, com o cordão envolvente lacrado, coisa que deu bom trabalho.. Lá dentro páginas A4, soltas, com poemas e excertos de prosa, para serem lidos, distribuídos, trocados, mastigados.

publicado às 10:35

 

Estante Austral (4)

"Canal de Moçambique", edição de 27/8/2014

 

"Rostos da Língua" de Eduardo White

Inesperada a malvada morte, a levar Eduardo White. Como acontece quando nos leva os escritores a fazer-nos revolver as estantes, vasculhar-lhes os livros. E, quando os conheceramos, a fazer-nos lembrar os episódios comuns, mesmo que secundários nas suas vidas.

Foi isso agora comigo, a empilhar-lhe os livros, voltando à frente e avançando para trás. E a recordar o White, o Eduardo e o Dino, conforme o tom do tempo. E do dia. Em particular a lembrar, com aguda saudade, os tempos em que ele produziu, muito mais ambicioso do que mero sonhador, o “Rostos da Língua. Breve Antologia de Autores de Língua Portuguesa”, uma edição de 1999, a cargo de uma coligação institucional (o Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa, o Movimento Artistas Contra a Pobreza, e o Instituto Camões – Centro Cultural Português de Maputo).

É desse período que me ocorre falar. Que sobre o intrínseco da poesia de White outros deverão falar, respeitador que vou da especificidade do “campo poético”, um universo, exigia ele, de particularidades no sentir. Uma estética própria, à qual associava uma exigência de ética própria, inacessíveis, reclamava ele, a nós-outros, comuns mortais.

Eu conhecera o EW poucos dias após chegar a Maputo. Na inauguração do agora Camões Maputo, do qual vinha eu como responsável. Lembro que me deparei com um homem enorme, vigoroso e reclamando, sem pejo, uma qualquer desatenção que entendia terem-lhe feito. Tratava-se da preparação de uma mesa redonda televisiva, a transmitir em directo no então célebre programa cultural da RTP, o “Acontece”, responsabilidade do já falecido Carlos Pinto Coelho, também ele daqui oriundo, sempre amável e que então se desdobrava em afabilidade com o poeta. Aderi à sua atitude, mas realmente estupefacto, com a inesperada personagem. Pois lera-o superficialmente, sem verdadeiramente atentar. Não era aquele White que escrevera “As aves / também nós cantamos. / De resto é tão pouco / o que nos diferencia desses animais /quando dentro temos uma / que vive / e não dorme”? Afinal assim? De facto a ave era aquela, viçosa, tonitruante e não a engaiolada que eu, distraidamente, imaginara.

(O texto completo está aqui)


 

publicado às 14:47

Textos de Eduardo White

por jpt, em 27.08.14

(Eduardo White com Nataniel Ngomane, foto daqui)

Eduardo White morreu no domingo. Recordo alguns textos que ele enviou, em tempos recuados, para o ma-schamba. Também quando ele andou nos blogs, no seu "Apassarado", entretanto apagado devido ao encerramento do portal que o acolhia (weblog.com.pt), efeito dessa incúria generalizada sobre os arquivos de blog. Aqui ficam as ligações:

- (15.5.2004): "Poema da perguntação".

- (28.2.2012): "A lusografia, a lusofonia e eu".

- (7.7.2004): "O poeta".

- (26.2.2008): "A Ilha (de Moçambique)".

- (12.4.2004): "Trecho do apassarado".

- (6.7.2004): "Requerimento".

  Deixo também alguns apontamentos que eu lhe dediquei:

- (22.2.2004): "Um livro de Eduardo White, esse pardo mestiço".

- (24.10.2004): "Excerto do Manual das Mãos". 

 - (7.5.2009): o meu apontamento "Manual das mãos". Este um "baby-blogging" que, quando contado ao Eduardo, logo valeu à minha filha a oferta do seu primeiro livro com dedicatória de autor.

 

 

publicado às 10:33

21 de Abril

por jpt, em 23.04.12

Sábado. De manhã conduzi um pequeno grupo, que convocara durante os dois últimos dias, ao bairro do Jardim, para visitar a casa de Ídasse. Alguns veteranos destas andanças, outros neófitos, até totalmente. Deram um mergulho, verdadeiramente. Encantaram-se, saíram cheios de sensações. E com as mãos cheias de obras, nitidamente aquelas que puderam levar. Ficou o pintor encantado, com o encanto que provocou. Eu, que quando for grande quero ser como o Ídasse, beneficiei-me com esta rápida "Demoiselles de Xilunguíne" (que é o nome que lhe dei).

Foi uma bela manhã, pela tarde dentro. E dela saímos invejáveis, por todos aqueles que não nos acompanharam.  

E pela tarde seguimos até à Feira do Livro de Maputo, na FEIMA, o parque que se vai instituíndo como uma aposta ganha quanto a animação da cidade (a animação gastronómica, o sítio do artesanato, as esplanadas e restaurantes, eventos vários, agora a festa do livro). Esta Feira do Livro é o que é: poucas bancas, poucas editores, nem todas as livrarias, algumas instituições (pior do que tudo, é até penoso de ver, a banca de monos super-usados da biblioteca do centro francês) com um ar mortiço. Mas é um esforço. Nesta tarde de sábado mostra também que este evento é uma porta para uma análise sociológica das práticas culturais na sociedade moçambicana letrada. Mas não foi para isso que lá fui, muito mais para fruir, apesar de estar, literal e radicalmente, desprovido do vil papel. Convívio, e as crianças a brincarem no parque ...

Assisti ao lançamento da edição em inglês do "Género, Sexualidade e Práticas Vaginais", Esmeralda Mariano e Brigitte Bagnol, um livro que é um marco nas actuais ciências sociais moçambicanas. Não só pelo necessário regresso à prática etnográfica mas também pelo mostrar como é possível fugir à chã "filosofia social" cristo-desenvolvimentista sem abandonar a aliança ciência-cidadania. É fundamental ler este livro e, com ele, sobre ele, imaginar como olhar o real.

Descubro, surpreendendo-me, uma banca dedicada a iconografia histórica: velhos postais, reproduções de fotografias, recortes de jornais, reproduções de mapas. Um casal espanhol, ali em regime de hóbi. Tipos óptimos, pelo que me pareceu. Arranjo 2 velhos recortes, algo fatigados, reproduzindo fotografias de Tambara, no Zambeze. Cada uma ao preço de um café. No fim-de-semana que vem estarão numa feira no café "Sol" (sommerschield "B"). Para os apreciadores ou curiosos valerá a pena ir lá beber um café. E, sim, estão lá alguns dos célebres postais editados por Santos Rufino ...

Depois, assisto a uma apresentação de "Reinata Sadimba", de Gianfranco Gandolfo (com fotos de Mário Macilau e arrumação de Ivone Ralha). A artista está doente e não esteve presente. As instituições oficiais espanhola e suíça, financiadoras, falaram - os espanhóis activos na área da "cooperação" cultural (muito também porque são activos na divulgação do que acontece), os suíços fazendo lembrar uma ligação do início da caminhada artística de Reinata com a cooperação suíça (com cidadãos suíços, será melhor dizer). O autor também botou, e "ameaçou" mais livros dedicados aos artistas moçambicanos - o filão destes que atravessam a carreira sem que fique um registo mais ou menos abrangente é enorme, está muito bem o Gianfranco Gandolfo. O livro parece ser interessante. O preço é proibitivo para o comum professor, ainda não me cheguei a ele para não me doer não o ter.

Mais tarde, na esplanada, um mais-velho lembra-me um texto sobre Reinata que escrevi há uns tempos, e diz-me que não estava mal. Confesso que, por isso, o "famous" me soube melhor ...

Sento-me numa roda, na esplanada, ofertado de um whisky bem-vindo, que serão dois. À Carolina, ali a acompanhar o pai, lembram-lhe uma sua curiosidade, coisa já de há anos. Que lhe vale agora, em gentileza que lhe ficará para o futuro, este "Nudos", a colectânea do ofertador, um príncipe quando o decide ser. Chegados a casa ela empresta-me o seu presente, folheio rapidamente. Uma iniciativa óptima, relevante. E bastante focada no passado. Para recuperar as obras já mais esgotadas, algo bem avisado? Ou outros critérios. O prefácio de Nuno Júdice não me esclarece. Aos livros do Eduardo White tinha-os a todos, lendo-os. Agora a Carolina começa a sua caminhada.

Nessa mesma roda, à volta da mesa rectangular, sei que dois outros escritores estão quase-quase a acabar livro. Um romance, outro contos. Fico à espera. Mostram-me, mas estou sem óculos e assim, ainda por cima na noite mal alumiado, já nem leio, uma prometedora colectânea de textos sobre Maputo lançada hoje mesmo, edição da Minerva. Contam-me, e de modo unânime, que lá está um belo texto de Mbate Pedro. E do primeiro-ministro. A sério? É mesmo. E também do Khossa, mas nisso a opinião não é unânime, ele abstem-se de concordar, e só lhe fica bem. Parece que é barato o livro, a esse hei-de chegar.

A banca da cooperação espanhola com publicações interessantes, acima de tudo com volumes dedicados ao actual paradigma da "cultura como vector de desenvolvimento". Passo por lá, escolho quatro. Baratos, 150 meticais cada um, diz-me o trabalhador na banca. É barato, concedo, mas estou tão xonado que não posso ali. Segui para a tal esplanada. Passado um bocado passam uns alunos, saúdam, e trazem os volumes, baixaram de preço, agora na alvorada da noite já a 50 meticais cada um. Explosão minha, tácticas de bazar numa feira de livro. Resmungo, mas ainda lá vou. O s  livros já quase esgotaram, mas ainda trago estes dois.

À noite o jogo espanhol. E os nossos emigrantes a ganharem, são eles (mais o Cristiano, sempre menino da nossa academia) que me fazem torcer pelo Real Madrid. E que grande golo, a calar os catalães, actuais exemplos de anacronismo xenófobo. Vejo o jogo em casa, visitado por amigo. No fim bebericamos e falamos da vida, quem conversa seus males espanta.

Foi assim o 21 de Abril de 2012. O meu pai faria 89 anos, o seu primeiro aniversário em que está ausente. Teria gostado de saber disto tudo, em particular das coisas da neta (que só em parte aqui aparecem). Dos detalhes e das opiniões. Não saberia das coisas do dinheiro, que isso não lho diria, claro. E gostaria de saber que a vida continua. Com os solavancos dela.

Parabéns, pai.

jpt

publicado às 01:24

 

E o Eduardo White empresta-me mais um texto, escrito para um encontro sobre "lusografia" realizado em Maputo, na UEM, em Fevereiro de 2008. Uma delícia. Um texto verdadeiramente a laWhite. E é o momento de o (re)ler. 

 

A LUSOGRAFIA, A LUSOFONIA E EU

por Eduardo White

 

O tema é, realmente, de muito interesse, mas confesso que são pequenas as minhas balizas sobre as Lusografias, sobre as lusofonias, ou melhor sobre esta coisa de lusos daqui, lusos de lá, para que o abordasse de outra maneira que não esta. Por isso, pergunto: Que geografias terá a minha grafia? As da minha língua? As das línguas da minha língua? Estas são, de repente, as perguntas que me ocorreram quando um amigo propôs-me o desafio de questionar-me, enquanto “poeta”, nesta coisa a que chamam lusografias. Decidi, então, procurar outras perguntas a partir de um Dicionário Universal de Língua Portuguesa. Recomendei-me, antes: Eduardo, não academizes nada, não és um académico. Ok. Vamos lá, por ordem, percorrer o abecedário do vocabulário. Na página 763 do tal dicionário, logo no topo, entre a numeração, duas palavras constituíam os dois lados do portal. À esquerda, gramaticologia que é o mesmo que dizer “o estudo científico da gramática. Do lado direito, granitificar que é o mesmo que ler “ transformar ou transformar-se em granito “. Logo pensei:. A falta de chão à esquerda levar-me-á, por certo, a empedrar-me à direita. Porém, aquietei-me. Decidi: Eu vou mas é percorrer tudo isto como percorro a escrita quando escrevo. E, assim, encontrada a palavra grafia, descobri-lhe, igualmente, o primeiro recuo. Grafia estava na página anterior. A 762. Muito bem. Vamos procurar-lhe a gema. E o que encontro no nutritivo amarelo da grafia, antes de qualquer outro significado, é isto : modo de escrever. Respirei fundo. Limpei-me dos medos. Retomo à palavra lusografia. Reparo que necessito de procurar definir, para melhor entender, a expressão luso. Soletro: g, h, I, j, l. Eis o l, na página 762. Do lado direito da numeração a palavra lupinotoxia, ou o mesmo que alcalóide venenoso dos tremoços. Deduzo, bem moçambicanamente, a envenenada anedota. Tremoços, Eusébio, Portugal. Estou perto. Leio, depois, no lado esquerdo luto: sentimento de pesar pela morte de alguém, mágoa, tristeza. Viajo, pela memória, no traje preto da varina da minha avó portuguesa. As suas amigas todas de preto na Madragoa. Oiço-lhe o fado. É aqui que paro. Digo-me. Dedo coçando o papel, encontro mesmo a palavra Luso, que será dizer lusitano, português, lusíada. Portanto, lusografia significa modo de escrever lusitano, português. Mas, porque carga de água pede-me o Cezerilo que eu escreva qualquer coisa sobre o modo de escrever português? Sobre o assunto, escrevem certamente melhor, os portugueses. Deixa-me perguntar-lhe. Agarro na minúscula tecnologia da mal encarada emecel e disco-lhe o contacto. Alo? Cezerilo? Não entendo bem. Afinal, o que me estás a pedir é que escreva sobre o modo de escrever português. Não caberá, mais abalizadamente, um escritor português escrever sobre o tema ? Não, mano Dino, diz-me ele, eu pedi que escrevesses sobre as lusografias. Bom, volto a pensar sobre o assunto. Não vá isto ser susceptível de ser uma visão xenófoba. Ponho a questão noutros termos. Assim: Lusografia, modo de escrever o português. E, nisto, logo se me põe outra cogitação. É que esta expressão, modo de escrever o português transporta-me a uma visão oliveirista mas não salazarista. Quero dizer, remete-me àqueles conteúdos dos filmes do Manoel Oliveira, ou seja, a essa visão do ser português. Bonacheirão afável e o humilde triste. Então, que tem isto a ver com este espaço onde me pedem para que disserte sobre Lusografia? Chamo pela Augusta, que é a minha companheira, e peço-lhe: Augusta, ajuda-me lá a ordenar as ideias. Estou encalhado à volta do assunto das lusografias. E ponho-lhe as palavras sobre o papel: 1. Luso. 2 grafia + tudo junto = Lusografia. Agora traduzamos para a nossa língua portuguesa a palavra. Muito bem 1. modo de escrever português. Faz-te sentido? A minha augusta Augusta sentencia. Modo de escrever português significa a maneira como escrevem os portugueses. Santa minha Augusta, exclamo, é também assim que o pensei. E se te puser a frase de outra maneira. Desta: modo de escrever o português. Diz-me ela. A maneira como se escreve o modo de ser português. Iluminada mulher, a minha, que esclarece os meus escuros. Penso, enquanto agradeço correctamente em língua portuguesa a Augusta. Mas, assim mesmo, me lembro de outro assunto: Minha mãe, portuguesa distinta da Madragoa, a chamar-me a atenção para os bons modos quando peço e recebo a sua ajuda. Diz-me ela: Agradece sempre o que recebes. E é nisto que me vem a fotografia do meu modo de escrever o português e que é o retracto escrito de minha mãe. Educada, sensível e terna. Mas, também, é este o meu modo de escrever em português: educado, sensível e terno. Então, se são todos estes modos, modos de escrever e até de entender, como entenderei o facto de em nenhum dicionário de português por mim pesquisado não vir referenciada a palavra lusografia? Ou será mais uma nova expressão da nossa sempre inventiva língua portuguesa? E estará assim a minha língua a lusitanizar-me? Eu moçambicano a falar-me com a minha realidade sociolinguística? E se me chamam, após tudo isso, de lusófobo? Não o podem, até porque o meu saudoso amigo Professor Manuel Ferreira lembrava-nos já que as modificações que a língua vem sofrendo nestes múltiplos espaços, criando situações de diglossia, vai, por simpatia, explodir nas línguas escritas, nomeadamente no texto texto literário. Daí que as literaturas destes países acusem, claramente, as interferências de outras línguas que não a portuguesa e a incorporação de novas aquisições lexicais provenientes dos novos espaços humanos, geográficos e sociais, e deste modo se organizam. As cartas de amor do meu meu pai, que é de Angónia, lá para o norte de Moçambique, deveriam ser um belo testemunho disso. Sempre escreveu como tetense o gordo murchem no caril e amou a minha mãe com os mais belos versos chuabenses. Tudo em Língua Portuguesa doutras crioulas grafias. Está pressuposto aqui que a grafia da Língua Portuguesa no meu caso, amoçambicanizou-se. Afinal, uma língua também se escreve como se a fala. Porém este facto é uma fatalidade que recai sobre uma língua desde que no quotidiano seja confrontada por outras Línguas que circulam com intensidade no mesmo contexto. Aqui, com estes pontos de vista, começo a tocar na questão da identidade, quero dizer, na moçambicanidade impercebível da minha língua que tem de entre outras identidades também e não somente a lusitanidade. Desconsigo-me na cabeça. É que toda a vida pensei que a minha moçambicanidade tinha por língua a minha moçambicanidade, quero dizer o meu moçambiquês e a minha moçambigrafia que é também donde eu entendo, vejo e respeito o lado da lusitanidade da minha língua. Mais claro, onde eu Eduardo White, moçambicano, me vejo a olhar a minha mãe, Maria Helena, portuguesa. Seja, na mesma língua com modos diferentes. Só para melhorar a ideia, a minha mãe portuguesa respeita com a lusitanidade com que está na sua língua a moçambicanidade com que a oiço na minha. O facto é tão somente este, falamos eu e a minha mãe a mesma língua com duas identidades diferentes. E como escrevemos a língua em que falamos, de que modo escreve a minha mãe português? Ou por outra, de que modo escrevo eu português? Como é que respondo a esta baralhada toda na língua portuguesa? Chamo de novo pela Augusta. Augusta, responde-me lá tu a estas perguntas, mas em português, peço-lhe. Reparo, assim, que a Augusta me responde em Língua Portuguesa com a sua Língua Portuguesa. Interessante isto. A Augusta a responder-me com a sua Língua que é a minha e que só é a mesma na identidade que nos cobre, a nossa moçambicanidade, mas completamente distinta no modo diferente das nossas origens. As terras onde nascemos. Mas isto no português é uma confusão. Perdão, não é isto o que queria dizer. O que quero dizer é, isto na Língua Portuguesa é uma confusão. Incrível como quer dizer tantas coisas a minha Língua. E querendo dizer muitas coisas, diz, por certo, muita gente. E eis que se me torna claro que há muitos povos diferentes a falar diferente a mesma Língua. Há várias normas e, logicamente, umas tantas Variantes. Não tenho dúvidas. A Língua Portuguesa é o património colectivo de cada um dos povos que a fala, ou não tivesse ela nascido no universo de cada um desses povos. Uma Língua falada é uma Língua que está permanentemente a nascer porque se não o faz no seu processo de ser Língua, gente, cultura, ideia, civilização, ela morre. Como é evidente, falo isto do modo que penso, muito moçambicanamente na minha Língua, com a minha língua e sobre a minha língua. Porque a língua tem sempre a identidade de quem a fala mesmo não sendo ela a sua língua. No entanto esta realidade, da Língua Portuguesa, tem simultaneamente o valor de verdade e o valor de falsidade. Quero dizer, é uma realidade que é e não é. A Língua Portuguesa é nossa, e não é nossa, e não é só nossa, porque sendo ela propriedade dos povos que a falam, é também ela fruto do que ganha com as outras línguas que também falam e são as desses povos. Em suma, a Língua Portuguesa é o que é nas diferentes maneiras de a pensarmos, de a escrevermos e de a sermos. Angolanos, Brasileiros, Caboverdianos, Guineenses, Moçambicanos, Portugueses, São Tomenses e quase ainda Timorenses. Mas retomo de novo, e se mo permitem, a lembrança do Professor Manuel Ferreira muito a propósito dos cinco: Os cinco partiram do princípio de que a língua é um facto cultural e os factos culturais começam por pertencer a quem os produz é certo mas a partir daí deixam de ter dono. São de quem os quiser ou tiver necessidade de utilizar. Reapropriaram-se da Língua Portuguesa como se deles fosse. Assumiram-na com toda a dignidade e naturalidade e agora reintroduzem-na por todo o seu espaço nacional, dando-lhe um estatuto nobre ao tempo que a vão interiorizando, tornando-a totalmente sua. Tão sua que a modificam, a alteram, a adaptam ao universo nacional ou regional e a transformam no plano da oralidade e no plano da escrita. E aqui, gostaria de fazer um aparte. O já meu celebérrimo Dicionário Universal de Língua Portuguesa, na página 101, vem como significado de anglófono o que se diz do indivíduo ou do povo que se exprime em inglês. Sem dúvida mas com curiosidade perguntei a um amigo Sul-Africano se existia na sua língua a expressão anglófono. Ele respondeu-me negativamente. Pego então no dicionário de Português – Inglês da Porto Editora e constato que a palavra não existe mesmo. Mas e existiria então tradução para lusófono? E a que encontrei foi esta: Portuguese; Portuguese speaking. Estranha e também curiosa a pobreza desta tradução. Mas bom, é uma questão que levanto porque não poucas vezes me confunde muito essa coisa de povos lusófonos com as suas lusofonias e as suas lusografias. Complica-me um pouco a cabeça que ainda falem de nós como povos lusófonos. E porquê esta carga toda de desidentidade? Porque falamos a Língua Portuguesa? É certo que não podemos fugir ao facto de que a Língua que todos falamos é a Língua Portuguesa que também é a dos povos lusófonos. Do Norte a Sul de Portugal. Mas não podemos correr o risco de que ao contextualizarmos essa realidade, desatribuamos com uma só identidade todas as outras identidades que é, por natureza, a Língua Portuguesa. Mas como na Língua Portuguesa também é comum a susceptibilidade, advirto já que não pretendo que sintam neste meu discurso, mais do que não seja apenas o querer levantar assuntos que não me são muito claros e que aspiro ver, em parte, aqui aclarados. Até porque, esta questão desta só identidade da Língua Portuguesa, tem sido quase que uma desajuda nos debates sobre as identidades dos povos africanos que falam esta língua. É que nenhum deles quer voltar a ser luso. Pelas razões que são bastamente conhecidas. A História e as identidades dos nossos povos se cruzaram há muitos anos, porém, há menos anos ainda se reescrevem em Língua Portuguesa. É preciso muito tacto quando as designamos e mais ainda quando as definimos. Não vá acontecer estarmos a cobrar, involuntariamente, aquilo que devemos. Este conceito das lusografias, no contexto dos povos lusófonos e da sua lusofonia deixa-me um pouco com o pé atrás quando tento perceber as suas motivações e finalidades. E porquê? Porque mexe com as identidades de cada um dos povos que se vêem, deste modo, injustamente inseridos nesse quadro que respeito e que é o da lusitanidade. Onde fica nesta designação a pluridentidade da Língua Portuguesa escrita e falada? Este é um facto, não podemos contorná-lo, muito embora possa ser um ponto de vista discutível como creio que é e como eu gosto de tornar as coisas quando não as percebo muito bem. Portanto, para terminar a confusão que é tudo isto na minha cabeça, peço-vos desculpas se este texto não faz absolutamente nenhum sentido aqui. Mas creio que concordarão que terá sentido que um cidadão falando e escrevendo da cidadania que lhe confere a sua Língua, a permita retractar nas inúmeras fotografias da prolixidade que acaba por ser a realidade da mesma.

 

jpt 

publicado às 12:50

Já há anos que aqui não entra um texto do Eduardo White. Agora reproduzo o que ele acaba de me emprestar, este recente "As línguas da nossa língua" - que ainda para mais vem muito a propósito. Publicado originalmente na revista Tempos Livres:

As Línguas da Nossa Língua

Eduardo White

Porque a língua tem esta faculdade de ser interpretativa mesmo sendo comum aos seus falantes. A língua que mente é a que veredicta, a que odeia é a que ama. As ironias evidentes de um só destino. E advinhe-se qual? O de que, nem tudo o que parece é.

Guarda a nossa Língua outras tantas línguas. A que falamos em comum e que por inerência das nossas culturas, nossas, as dos falantes, se amaneirou de identidades próprias, e de sonoridades e estruturas a elas subjacentes. A língua que falamos, passou, assim, por espelhar povos tão diferentes e tão eloquentemente multifacetados. Tornou-se mesmo uma ponte entre as distâncias das Nações que somos.

Mas, o mais notável que tenho constatado, para além do que já nos é comum saber quanto à importância que a nossa Língua Portuguesa tem de nos tornar perto estando nós tão longe, é a que encontro nos lugares do dia a dia. Por exemplo, num bar, numa cafetaria, numa festa. E, a esse propósito, aconteceu-me, lá por Lisboa, estar eu sentado numa pastelaria e ter ouvido uma senhora a pedir a conta ao empregado de mesa. De princípio nada tem o facto de invulgar. Se estamos numa pastelaria, é evidente que acabamos sempre por pedir a conta. A menos que nada tenhamos consumido. Porém, não sendo o português que falo o português de Portugal, a moçambicanidade da minha língua deixou-me quase que atónito quando o empregado, ao trazer a conta, diz para a senhora: - Então, é uma Coca-Cola e três línguas de veado.

Olhei para ele atónitamente e, confesso, meio encabulado. Não estava a perceber de como os bons modos se tornavam, tão de repente, numa marca de tão pouca cortesia num recinto de denotada fineza. Dei-me, um pouco mais reflectidamente, ao benefício da dúvida, não fosse ter mesmo consumido a senhora, as três línguas de veado. O que não deixava de ser estranho, para mim, que tal subtileza gastronómica se servisse num café. Mas como estou sempre a aprender, de cada vez que viajo, fiz por não me surpreender. Cairá por terra, a seguir e entretanto, tal esforço, ao notar a senhora, educadamente, a liquidar a conta. Mas, porque carga de água, num pequeno pires sem resíduos de molho algum e com uns restos do que me parecia ter sido um bolo, se dava como pagas línguas de veado?

Perguntei-me eu. Daí a pouco tempo e como resultado de acautelada investigação, se deu como confirmado, junto ao empregado, de que não eram as línguas as de tal animal, mas biscoitos. Sendo assim, restava-me uma outra curiosidade por satisfazer. A se estariam tais iguarias conotadas ao quadrúpede ou a certas pessoas a quem os nossos irmãos brasileiros costumam adjectivar. Não sendo a primeira como se veio a comprovar, pus-me a cogitar de que modo entenderiam os brasileiros as línguas de veado. Por sua vez, se pediriam os veados, no Brasil, os doces em questão e como entenderiam os mesmos tais línguas aqui?

É que não me esqueço de certa complicação, de que fui autor, no aeroporto de São Paulo, quando indaguei a um sujeito porque me estava a passar, á frente, na bicha, se não tinha estado na bicha. A confusão, até que se explicasse, foi, deveras, um problema quase diplomático. O drama esteve às portas de ser consumado devido a uma simples interpretação linguística entre pessoas falantes da mesma Língua. Sim, porque em Moçambique, bicha é o que é fila para os brasileiros. Mas, imagino eu um dilema maior que era o de pedir, num restaurante, para uma originalíssima senhora moçambicana, tal ementa:

Bebidas : Licor de merda, Vinho Periquita. Bifana no Pão: Caralhotas Comidas: Sopa de Grelos, Punhetas de Bacalhau. Sobremesa: Fatias Paridas

Ela olhar-me-ia, com toda a certeza, com um olhar indignado e depressa me deixaria sozinho à mesa, sem, ao menos, a oportunidade de poder explicar-lhe que tal ementa era típicamente portuguesa e não uma blasfémia em português. Portuguesa do Portugal de onde nos é oriunda a língua que falamos e nos entendemos, eu e ela, mesmo com as nossas diferenças étnicas e que nos permitem comunicar se não tivéssemos em comum o Português. E, porque, deste modo, também se traduz a lusófonia, esta palavra que qualquer dia dará o nome a uma qualquer iguaria, também, de igual modo, nos entendemos e vemos lusófonos em detalhes tão peculiarmente pequenos como o é este que relato e nos faz tão imensamente grandes. Grandes no sentido de que a Língua, acaba por nos trazer a mais valia incomensurável de podermos partilhar, com tolerância, os sentidos que a ela damos nas diferenças que somos inevitávelmente. Já o antevia Fernando Pessoa quando dizia que a sua Pátria era a sua Língua e nenhuma outra maneira de estar nos poderia responsabilizar melhor por ela e nem melhor nos poderíamos sentir nela.

jpt

publicado às 11:23

"Dançando com a Chuva", um bailado escrito por Eduardo White.

4 e 5 de Novembro,   às 19,30 horas,  no Centro Cultural da Universidade Eduardo Mondlane, Av. Agostinho Neto (junto INAC)

com os bailarinos Julieta Khau, Abel Fumo Maria José Gonçalves, Ussene Ali, Alex Coana, Abdul Matusse, Dawaniveria, Zacarias Mahumane, Mário Vumba

Direcção Coreográfica | Pérola Jaime

Direcção Musical | Chico António

Direcção Cenográfica | Ulisses Oviedo

jpt

publicado às 01:11

A nova Índico

por jpt, em 05.05.10

[Índico, Série III, nº.1, Maio-Junho 2010]

Este é o primeiro número da nova série (a terceira) da Índico, a revista das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM). Que passou a ser editada por Nelson Saúte, o qual logo a tornou algo distinta. Se a série anterior era muito capaz, enquanto mera revista de bordo, o novo formato eleva a Índico à revista cultural moçambicana, com toda a certeza a coleccionar (assinar?, ou a ir pedir às delegações da LAM?), algo que muito faltava no país. Veja-se este primeiro número, que surge com artigos evocando o mundial de futebol que o vizinho albergará e o trigésimo aniversário da companhia, neste caso com texto de José Luís Cabaço. Mas depois, e para além de alguns textos de ocasião sobre destinos turísticos, surge o núcleo duro. Luís Bernardo Honwana revelando-se como surpreendente fotógrafo. E textos de Eduardo White, Marcelo Panguana, Mia Couto, Nelson Saúte, Paulina Chiziane, Júlio Carrilho, Ungulani Ba Ka Khosa, uma selecção nacional das letras moçambicanas. E um cuidado, sempre discutível mas cuidado, roteiro da capital. Para além de escaparates dedicados à edição livreira e musical, bem como aos ateliers de artistas plásticos.

A desejar bons mares e bons ares à Índico. Para que assim se mantenha.

jpt

publicado às 16:01

Manual das Mãos

por jpt, em 07.05.09

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Ela (olhando atentamente o pai que lê) - "Manuel ... Manuel das Mãos!?"

Mãe - "Manual!, querida, Manual das Mãos."

Ela - "Manual? O que é Manual?"

Mãe - "Manual é um livro que ensina a fazer coisas."  - e segue, até etimológica?, -  "Manual das Mãos é como um livro que ensina a fazer coisas com as mãos."

Ela (lesta, feliz) - "Eu também sei fazer coisas com as mãos." - e logo exemplifica por gestos - "...coelhinhos ... dinossauros ...".

Pai (lesto, feliz) - "É isso mesmo, é como se tivesses lido o livro."

Ela (surpresa) - "A sério?!"

publicado às 12:29

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"Eu gostava de poder fugir a esta realidade tão fulminante. Dizem-me os amigos para enfrentar o problema, para agarrar o touro pelos cornos. Aliás, dizem-no sempre quando isto não é o que se passa com eles.

(...)

Penso, como consequência, em partir. Para onde? Não sei, se tivesse dinheiro era para uma ilha. A minha ilha, Moçambique. É bela. Antiga. Magistral.

Vejo-a:

(...)

A ilha suspende-se entre o vento e um negro reluzente cruza a praia com os olhos lavrando as areias. Não sei se reza, mas que pensa é mais que evidente. Testemunham os brancos cabelos e as mazelas no caqui dos desbotados calções. Cheira a marisco a brisa que inalam as narinas dentro desta paisagem e a cânfora, alguma, das memórias que ela desenha.

As redes que sobre o chão encontro estendidas, são cartas oceânicas que escreve o fundo do mar. Do texto salta a prata dos peixes, o verde amaciado das algas e uma estrela imóvel que explode, por dentro, a terra toda a girar. Claro que a areia as grava. Nossa forma de escrita mais milenar que a geringonça mágica de Gutemberg. Porque Deus descansa aqui, ao cair da noite. Silenciosamente medita por entre as lágrimas das tartarugas que junto a ele vêm desovar, ou de um negro mácua, estirado sobre o desgosto, a chorar um amor que, por teimosia, não quer morrer.

(...)

Por isso a Ilha é calma. Tonta de tanta quietude e, talvez, será o que querem dizer as faces delicadas das suas negras, as mãos talhadas dos seus ourives.

Assim, o meu velho Camões, macúa zarolho só por ter visto sempre demais, terá, talvez, ali, amado seu negro, seus humanos adamastores e com eles provado essa fatalidade incontornável de ser poeta sem ilha na ilha extensa dos que nela, até hoje, não o sabem ler.

Mas era para lá que eu queria partir."

[Eduardo White, O Manual das Mãos, Campo de Letras, 2004, pp. 61-62]

publicado às 10:48

Eduardo White

por jpt, em 08.03.08

Anos depois do encerrar o seu Apassarado o Eduardo White, por ora em Lisboa, deixa aviso de que regressa a estas blogandanças: abriu o Meu Quintal Dividido. Um abraço!

publicado às 20:00

De Eduardo White não tenho notícias há muito - em Portugal, sussurram-no alguns conhecidos comuns. Aqui deixo um texto dele (ele que, infelizmente, se desmaschambou) sobre a Ilha de Moçambique. A lembrar-me que o conheci em tempos de abrir janelas sobre o Índico ...

A ILHA

Um pássaro revolve as asas por dentro do azul esbatido do mar. Traça a casa líquida que às estrelas, certamente, o seu piar vai dar. A história é-lhe longe, são formas entrecortadas sobre a espuma amarelecida dos navios cargueiros, que beijam lentos o horizonte e movem silenciosos outras cargas. A ilha suspende-se entre o vento e um negro reluzente cruza a praia com os olhos lavrando as areias. Não sei se reza, mas que pensa é mais que evidente. Testemunham os brancos cabelos e as mazelas no caqui dos desbotados calções. Cheira a marisco a brisa que inalam as narinas dentro desta paisagem e a cânfora, alguma, das memórias que ela desenha. As redes que sobre o chão encontramos estendidas, são cartas oceânicas que escreve o fundo do mar. Do texto salta a prata dos peixes, o verde amaciado das algas e uma estrela imóvel que explode por dentro a terra toda a girar. Claro que a areia as grava. Nossa forma de escrita mais milenar que a geringonça mágica de Gutemberg, porque Deus descansa aqui ao cair da noite. Silenciosamente medita por entre as lágrimas das tartarugas que junto a ele vêm desovar ou de um negro macúa, estirado sobre o desgosto, a chorar um amor que por teimosia não quer morrer. Vão longe a navegar os versos da miséria que do Luís de Camões a história quis esconder. Os ducados que nunca teve, nem para voltar nem para morrer, servem outros democráticos reinados e engordam a mesa dos que ainda julgam que poeta bom só miserável pode escrever. Lêem e estudam o que os poemas não dizem, sábios doutores esses universos etários, e nem com verdade podem, entretanto, entender o que eles explodem e dóiem e fazem crescer no coração esquecido dos seus autores. Por isso a Ilha é calma. Tonta de tanta quietude e talvez será o que querem dizer as faces delicadas das suas negras, as mãos talhadas dos seus ourives e os olhos aluadores e viajantes das suas crianças. Por isso o meu velho Camões, macúa zarolho só por ter visto sempre demais, terá talvez aqui amado seu negro, seus humanos adamastores e com eles provado essa fatalidade incontornável, de ser poeta sem ilha na ilha extensa dos que aqui, até hoje, não sabem ler.

Eduardo White

publicado às 00:27

Os Poetas e a Independência

por jpt, em 29.08.05


Ouvir poesia, coisa já rara nos últimos anos. Lembro-me de alguns espectáculos há alguns anos, mas foram caindo em desuso. Ao último que tive notícia fui obrigado a perdê-lo, um solo de White no Café com Letras, para aí há um ano e meio, que me disseram excelente. Ontem houve, forma de comemorar os 30 anos de independência de Moçambique e também os 10 anos de existência do BIM, patrocinador. Talvez resultado de mero preconceito meu, mas alguma surpresa, positiva claro, ao ver um banco a comemorar-se organizando um sarau de poesia. Coisa em grande, em meios e intenção. E espero que a gravação possa vir a surgir em televisão.

Ainda que não sendo original é marcante a ideia de contar a história do país pela sucessão das palavras daqueles que dele quiseram ser poetas, que terá sido essa intencionalidade um dos fios condutores que o Eduardo White escolheu para escolher o que ontem ali foi dito: Noémia de Sousa, José Craveirinha, Rui Nogar, Rui Noronha, Marcelino dos Santos, Jorge Rebelo, Fernando Ganhão, Albino Magaia, Jorge Viegas, Calane da Silva, Leite de Vasconcelos, Filimone Meigos, Armando Artur, e ele próprio, Eduardo White. Poesias diferentes, intensidades diferentes, claro. Coisa que um espectáculo sente, mas do qual também vive. Até porque foi dia (também) de historiografia, a tal história da ideia de Moçambique na voz dos poetas.

Como falar quando são amigos que fazem? Assim um tipo fica sem jeito para criticar. Gente diferente a dizer: Eduardo White, Anabela Andrianopoulos, Ercílio Fernandes, Jaime Santos, Claudia Constance, esta em estreia, e muito bem. Gente diferente, registos diferentes. Repito, coisas que um espectáculo sente, mas do qual também vive. Mas não resisto, que amigo de palmadinha nas costas não serve para muito - para quê as fracas danças, e tantas foram? Música? Vá lá, concedo, ainda que achasse excessiva. Agora dança? Não.

(Se passares aqui e te zangares paciência. Mas tenho razão).

O sítio. A muito gostar da escolha dos Correios de Moçambique, belo edifício (e com um balcão histórico) que justifica, e merece, a sua utilização para mais eventos que os postais - ainda que tenha má acústica. Agora seria só retirar o recente, e decerto dito "moderno" e "funcional", posto de venda à entrada da sala, coisa inútil em tão grande espaço e que tanto reduz aquele "ex-libris". E, claro, aproveitar o exemplo para dar mais uso à sala.

publicado às 20:00

Patraquim e White

por jpt, em 24.01.05

Leio, em pequena nota de jornal de fax, notícia da publicação em Portugal do novo livro de Luís Carlos Patraquim: "O Osso Côncavo e Outros Poemas" (Editorial Caminho). Se não estou em erro o primeiro livro desde "Lidenburgo Blues", já de 1998. Talvez...

Fica-se aqui à espera. A ver se alguém o faz aqui chegar mais depressa do que o "Manual das Mãos", a última obra de Eduardo White, saída há meses em Portugal pela Campo de Letras, e que só agora encontro aqui, em dois escaparates (mas só nesses dois).

publicado às 20:01

Prémio José Craveirinha 2004

por jpt, em 22.12.04
O Prémio José Craveirinha 2004, o mais prestigiado prémio literário aqui, atribuído pela Associação de Escritores Moçambicanos sob patrocínio da Hidroeléctrica de Cahora-Bassa (5000 USD), foi agora atribuído em paralelo aos poetas Eduardo White e Armando Artur.Este machambeiro teve hoje o prazer de beber uma (ou talvez um pouco mais) cerveja com os laureados. Este machambeiro tinha camisola vestida neste prémio, mas isso também não é muito importante. Meras opiniões.

publicado às 15:36


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