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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
Quando era pequena, lembro-me de lhe escrever pequenos postais realizados na escola para assinalar o dia. Nos tempos de adolescência, presentava-o com objectos que sabia serem do seu agrado.
Mais tarde, deixei-me disso e dava-lhe beijos. Nos últimos anos, homenageio-o através deste espaço.
Agradeço-lhe sempre a sensibilidade, a justeza, a veia artística. O facto de colocar-me em contacto com o teatro desde tenra idade. As horas e os dias passados à volta da aparelhagem 'profissional' que mais ninguém possuía. As músicas, o Sinatra e o ter-me ‘apresentado’ os Joy Division quando poderia e/ou deveria ter sido ao contrário.
E a paixão pela fotografia.
Essa paixão que o levou a montar um laboratório amador para fotografia a preto e branco no sótão dos meus avós e onde eu me extasiava a observar as fotos que apareciam depois do papel ter sido mergulhado nos líquidos reveladores.
Hoje, em jeito de homenagem, partilho convosco algumas experiências que ele fez nesse âmbito. Apesar de ser Dia do Pai não o consigo dissociar de minha mãe, tal é o modo como se amam e se respeitam. Bem hajas, PAPI!
VA
(Amanhã é o centenário do nascimento de Álvaro Cunhal. Por isso aqui replico um postal que botei há uns meses. Também forma de um pequeno brinde, com rum, com a memória do meu pai, que dele foi grande admirador).
A Câmara Municipal de Lisboa chamou Álvaro Cunhal a uma avenida, neste ano do seu centenário. Resmunguice à parte, o homem foi "bigger than life", como se quer a alguns. Raríssimo, pois assim. Mais raríssimo ainda, se pensarmos no mundo português. Voto sim! Gulags?, Angolas?, Hungrias?, Checoslováquias?, o XX totalitário? Ok. Mas que panache tinha Cunhal. E que dimensão. Voto sim, venha a avenida Cunhal!
Depois lembro-me do meu pai António, comunista até à sua morte, "sem culto da personalidade", claro, e como tal "não-cunhalista" como o eram os comunistas da sua geração. Lembro agora que soube da morte do velho líder comunista numa manhã, em plena reunião na universidade. Ao entrar no anfiteatro, único português presente, vários colegas se levantaram para me darem os pêsames. Não, não tenho fama de comunista, alguns até me julgam algo fascista (e talvez não apenas por não ser fan da retórica semi-porno do revolucionarismo hedonista d'hoje em dia). Eram convictas essas condolências, um património simbólico do meu país que partia. Logo fui telefonar para a longínqua casa, "mãe, como está o pai?", "ai, filho, muito em baixo...", morrera pouco antes Vasco Gonçalves, naquele momento o sempre "secretário-geral". As figuras daquela geração. E, para aqueles, esta a maior de todas.
Entre esta lembrança de um homem ímpar e do apreço que lhe tinha o meu pai suspendo a vertigem crítica. E para isso nem preciso olhar os anões sôfregos que pululam na cena pública do meu país. Basta-me a memória do homem. Sem perseguir o que quis. Sabendo-o maior do que muito do que quero. E, com toda a certeza, do que os que querem o que eu quero.
Foi aos 38 anos que virei a minha vida do avesso. Carreguei o meu passado – escovei o menos bom e dei brilho ao melhor. Olho agora para trás com alegria, contente com os passos que dei.
Moçambique independente faz hoje 38 anos. Infância conturbada, adolescência difícil. Que a idade adulta lhe traga a maturidade e a serenidade que hoje me animam nos altos e baixos de uma vida cheia.
Danço pois com uma velha amiga (aqui na cooperativa já repetente) e encerro o aniversário com um desejo.
Por definição, que me apraz sobejamente, o ma-schamba despreza os dias internacionais e mundiais 'disto e daquilo' e só muito pontualmente assinala este tipo de efemérides.
Hoje, dia 27 de Março de 2013, comemora-se uma vez mais o Dia Mundial do Teatro.
Seja por questões emocionais - o teatro é a minha paixão primeira - seja porque é num teatro que a minha actividade laboral se desenrola, ou seja ainda porque uma das mais importantes manifestações deste dia é a difusão da Mensagem Internacional, escrita tradicionalmente por uma personalidade de dimensão mundial convidada pelo Instituto Internacional do Teatro para partilhar as suas reflexões sobre temas de teatro e paz entre os povos e lida perante milhares de espectadores antes dos espetáculos nos teatros do mundo inteiro, hoje é a minha vez de praticar a excepção à regra.
Este ano a mensagem foi solicitada ao italiano Dario Fo. Nascido em 1926, Dario Fo é actor, dramaturgo, director, cenógrafo, activista político e Prémio Nobel da Literatura em 1997. O seu contributo, sempre irónico, reza assim:
"Já faz muito tempo que a forma de resolver o problema da intolerância para com os comediantes era expulsá-los do país. Hoje, os atores e as companhias de teatro têm dificuldades em encontrar teatros, praças públicas e espectadores, tudo por causa da crise.
Os governantes, portanto, não estão mais preocupados com os problemas de controlo sobre aqueles que se expressam com ironia e sarcasmo, já que não há lugar para atores, nem existe um público para assistir.
Ao contrário, durante o período do Renascimento, na Itália, os que estavam no poder tinham que fazer um esforço significativo para manter em seus territórios os Commedianti, uma vez que estes desfrutavam de um grande público.
É sabido que o grande êxodo de artistas da Commedia dell'Arte aconteceu no século da Contra-Reforma, que decretou o desmantelamento de todos os espaços do teatro, especialmente em Roma, onde foram acusados de ofender a cidade santa. Em 1697, o Papa Inocêncio XII, sob a pressão de insistentes pedidos do lado mais conservador da burguesia e dos expoentes do clero, ordenou a demolição do Teatro Tordinona, em cujo palco, segundo os moralistas, tinha encenado o maior número de performances obscenas.
Na época da Contra-Reforma, o cardeal Carlo Borromeo, que era ativo no Norte de Itália, havia se comprometido com o resgate dos "filhos de Milão", estabelecendo uma clara distinção entre a arte - como a mais alta forma de educação espiritual, e o teatro - a manifestação de palavrões e de vaidade. Em uma carta dirigida aos seus colaboradores, que eu cito de improviso, ele se expressa mais ou menos da seguinte forma: '(...) em relação à erradicação da erva do mal, fizemos o nosso melhor para queimar textos que continham discursos infames, para erradicá-los da memória dos homens, e, ao mesmo tempo, a processar também aqueles que divulgaram tais textos impressos. Evidentemente, no entanto, enquanto estávamos dormindo, o diabo trabalhou com astúcia renovada. Como penetra na alma mais do que o que os olhos vêem, o que você pode ler nos livros desse tipo! Assim como a palavra falada e o gesto apropriado são muito mais devastadores para as mentes dos adolescentes e jovens do que uma palavra morta impressas em livros. É, portanto, urgente livrar nossas cidades de fabricantes de teatro, como fazemos com as almas indesejadas.'.
Então, a única solução para a crise está na esperança que uma grande "expulsão" seja organizada contra nós e, especialmente, contra os jovens que desejam aprender a arte do teatro: a diáspora nova de comediantes, de fabricantes de teatro, que, certamente, a partir de tal imposição, terão benefícios inimagináveis para uma nova representação."
Dario Fo
(a tradução apresentada acima é a versão brasileira, bastante mais fidedigna do ponto de vista formal)
VA
[Pescador da Inhaca por Miguel Barros]
Não me lembro exactamente da data de estreia do nosso grupo – ma-schamba – no Facebook, mas parece-me relativamente recente. Pouco meses depois estamos, hoje, com 5599 membros. Número redondo, bonito. Em pares. Juntam-se a estes os 1743 subscritores da página blog ma-schamba, também no Facebook.Mistificada que estou com tamanha adesão – não somos profissionais da pena, não escrevemos em jornais ou revistas, não somos “estabelecedores de tendências” e tampouco somos “fazedores de opinião” – agrada-me saber o ma-schamba querido de tanta gente. Digam o que disserem e modéstia à parte, é bom sentir que somos lidos; é bom ouvirmos o eco das nossas teclas. Estreei-me no ma-schamba com uma fotografia do nosso amigo Miguel Barros; aproprio-me hoje de um quadro dele – Pescador da Inhaca – para vos agradecer a vós, que estais do lado de lá deste écran. Em nome do colectivo, bem-hajam!
AL
A fotografia como expressão artística sempre me fascinou. Seja ela uma impressão, uma ideia ou a captação de um momento que, em última análise, é sempre descontextualizado, a fotografia, para além de possuir a capacidade de nos fazer crer no ‘real’, também permite a projecção de imaginários escondidos, mundos e submundos outros. É uma espécie de pintura ‘ao vivo’, um cenário ‘real’, uma ideia concretizada.
Neste sítio que tenho o privilégio de partilhar, a presença de dois fotógrafos conceituados e talentosos inibe-me de alvitrar um pouco mais sobre esta arte.
Mas HOJE, dia 19 de Março de 2012, atrevo-me a mostrar uma experiência de captação do momento ali ao Cais do Sodré há alguns anos atrás.
Também porque faz HOJE um ano que visitei o ‘atelier’ de Alfredo Munoz de Oliveira (ver aqui http://f8fotografia.zenfolio.com) na Figueira da Foz e tive o prazer de o conhecer pessoalmente.
E finalmente, porque HOJE a plataforma da CP que outrora fotografei encontra-se plena de comboios rumo a destino desconhecido. Ahoje é Ahoje!!!
VA
Depois das comemorações natalícias, este ano deveras familiares, agradavelmente generosas e francamente afortunadas, vem aí o novo ano…
Seguidamente a rechear peru, cozinhar tarte de castanhas e confeccionar demais acepipes (sem falsa modéstia, confesso que até me desembaraço bem nestas lides) e após ter falhado os oficiais votos de BOAS FESTAS BOAS ma-schambeiros, antecipo-me e DESEJO A TODOS OS MA-SCHAMBEIROS - excelsos co-bloguistas e prezados leitores - um BOM ANO BOM 2012 tendo em conta que as previsões são de um ano basto iluminado (‘shining’ para os anglófonos).
BOM ANO 2012
VA
Uma iniciativa CESNOVA/ Faces de Eva, em colaboração com a UMAR - Leitura Colectiva - Novas Cartas Portuguesas
Terça-feira, 25.10.2011 as 18:30, no Centro de Cultura e Intervenção Feminista (CCIF), Rua da Cozinha Económica, Bloco D, 30-M e N, Alcântara, Lisboa.“ o preácio à edição (Francesa) de 1974, escrito por Evelyne Le Garrec e Monique Wittig, expõe o trajecto das Novas Cartas Portuguesas no país e no estrangeiro e as relações que se estabeleceram entre as autoras e o movimento feminista em França. (...) No prefácio é ainda relatado que no dia 25 de Outubro, em Paris, durante a Noite das Mulheres num teatro e numa assembleia composta, pela primeira vez, unicamente por mulheres, se ouviu a leitura de excertos das Novas Cartas Portuguesas.”Feminismos, Manuela Tavares (p 191-192) No ano em que celebramos 40 anos sobre a escrita de Novas Cartas Portuguesas, de Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, nasceu uma vontade de (re)ler esta obra, sempre nova, sempre histórica, sempre feminista. O processo instaurado às autoras, depois da apreensão do livro, em 1972 provocou uma onda de solidariedade internacional. Foram várias as manifestações feministas de apoio às “Três Marias”, nome pelo qual o processo ficou conhecido, uma delas aconteceu a 25 de Outubro de 73, num teatro de Paris, onde excertos das Novas Cartas Portuguesas foram lidos por uma assembleia composta, pela primeira vez, apenas por mulheres.Inspiradas por esta acção de solidariedade para com as autoras, vamos então ler a obra, em conjunto, e (re)descobrir o prazer de uma leitura feita assim, colectivamente. Estão todos convidados a participar neste momento único.AL
["Rio Zambeze (AL)"]
Quem somos, senão o que imperfeitamente
sabemos de um passado de vultos
mal recortados na neblina opaca,
imprecisos rostos mentidos nas páginas
antigas de tomos cujas palavras
não são, de certo, as proferidas,
ou reproduzem sequer actos e gestos
cometidos. Ergue-se a lâmina:
metal e terra conhecem o sangue
em fronteiras e destinos pouco
a pouco corrigidos na memória
indecifrável das areias.
A lápide, que nomeia, não descreve
e a história que o historia,
eco vário e distorcido, é já
diversa e a si própria se entretece
na mortalha de conjecturados perfis.
Amanhã seremos outros. Por ora
nada somos senão o imperfeito
limbo da legenda que seremos.
Rui Knopfli - Quem somos
Preciso ser um outro
para ser eu mesmo
Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta
Sou pólen sem insecto
Sou areia sustentando
o sexo das árvores
Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro
No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço
Mia Couto - Identidade
AL
Memorial day. Bitter salt is dressed upas a little girl with flowers.The streets are cordoned off with ropes,for the marching together of the living and the dead.Children with a grief not their own march slowly,like stepping over broken glass.
Memorial Day for the War Dead by Yehuda Amichai
Hum by Ann LauterbchThe towers are incidental.What are these ashes?Here is the hateThat does not travel.Here is the robeThat smells of the nightHere are the wordsRetired to their booksHere are the stonesLoosed from their settingsHere is the bridgeOver the waterHere is the placeWhere the sun came upHere is a seasonDry in the fireplace.Here are the ashes.The days are beautiful.
After the thunder wilder than thunder,after the booming ice storm of glass from the great windows,after the radio stopped singing like a tree full of terrified frogs,after night burst the dam of day and flooded the kitchen,for a time the stoves glowed in darkness like the lighthouse in Fajardo, like a cook's soul.Soul I say, even if the dead cannot tell us about the bristles of God's beard because God has no face,soul I say, to name the smoke-beings flung in constellationsacross the night sky of this city and cities to come.Alabanza I say, even if God has no face. Alabanza. When the war began, from Manhattan to Kabultwo constellations of smoke rose and drifted to each other,mingling in icy air, and one said with an Afghan tongue:Teach me to dance. We have no music here.And the other said with a Spanish tongue:I will teach you. Music is all we have.Alabanza: In Praise of Local 100 by Martin Espada(poema dedicado ao pessoal do restaurante Windows of the World no topo da torre norte to World Trade Centre)
I Measure Every Grief I Meet by Emily DickinsonI wonder if it hurts to live – And if They have to try – And whether – could They choose between – It would not be – to die –
The Second Coming by W B YeatsALSurely some revelation is at hand;Surely the Second Coming is at hand.The Second Coming! Hardly are those words outWhen a vast image out of Spiritus MundiTroubles my sight: somewhere in sands of the desertA shape with lion body and the head of a man,A gaze blank and pitiless as the sun,Is moving its slow thighs, while all about itReel shadows of the indignant desert birds.The darkness drops again; but now I knowThat twenty centuries of stony sleepWere vexed to nightmare by a rocking cradle,And what rough beast, its hour come round at last,Slouches towards Bethlehem to be born?