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É minha ideia, talvez algo "poluída" pela amizade, que o arquitecto Mário do Rosário é o mais sábio dos meus conhecimentos em Moçambique. Profundo conhecedor do país, que calcorreia há décadas, abrangendo-o com um olhar de arquitecto atento às dimensões sociais que é muito raro numa profissão internacionalmente encantada com a réplica das urbes, endo-centrada e onde a religião actual é o culto do menir (falo) de vidro. Mário do Rosário é também o coordenador do curso de Arquitectura no ISCTEM, o segundo curso do país nessa disciplina, o que me permite ter esperança que nos próximos anos despertarão em Moçambique alguns (nunca serão mais que alguns ...) arquitectos menos como eles costumam ser.

 

Amanhã o Mário do Rosário falará no Porto, na Faculdade de Letras. Aconselho quem lhe esteja próximo a que interrompa a respectiva agenda e vá ouvir este humanista.

 

Aqui fica uma breve sinopse. Que é, acima de tudo, uma complexa agenda de reflexão:

 

Repensar Arquitectura em Moçambique e na região: desafios e oportunidades na necesssidade de sobrevivência e de crescimento humano, económico e sociocultural; procurar os contornos de uma identidade cultural, feita de cruzamento de culturas facilitadas pelo Índico, tendo em conta os intercâmbios culturais, o colonialismo, o imperialismo moderno. 

 

Reflectir sobre o periodo pós-guerras, sob uma Paz regional e de empobrecimento crescente, tendo em conta as assimetrias de eixos de exploração de recursos naturais espartilhando o território em áreas isoladas longe dos benefícios do dito desenvolvimento – a nova ordem urbana regional, num contexto de vivência da Natureza, ao sabor das suas mudanças, e sem perspectiva de industrialização. 

 

Neste contexto que relação homem x materiais naturais x espaços construídos na Natureza? Que estrutura urbana? Gerida pela Cidadania ou pelos eixos de exploração do Capital? Que visão para o futuro espaço africano? Afirmação moderna da sua própria Cultura ou submissão aos cânones despersonalizantes do mundo ocidental?

 

jpt 

publicado às 18:29

 

O ano lectivo do ensino português começa para a semana. A Escola Portuguesa de Moçambique reabrirá as suas portas, para bem dos seus alunos e descanso dos respectivos encarregados de educação. Globalmente a escola funciona bem, e se tudo o que é humano é criticável neste caso o saldo é bem positivo. Está portanto de parabéns a Escola Portuguesa de Moçambique.

 

E, muito em particular, porque consegue deixar uma mensagem no seu sítio electrónico, anunciando as modalidades de "receção" dos alunos (que começarão no dia 3 de "setembro" e prosseguirão), em que não abundam os erros ortográficos. Tem, mas não são abundantes. Coisas deste Acordo Ortográfico, a tralha que alguns dizem ser inconstitucional, a tralha que o secretário de Estado (ou "estado"?) diz ter que ser revista (e, se assim é, como pode ser ensinada neste formato?), a tralha que, assim sendo, está à experiência. Claro que a desobediência cívica é difícil de exigir aos funcionários do Estado, como são os docentes. Claro que é desumano criticar uma pequena falha (quem não as comete?). Mas tudo isto é sintomático da confusão gerada por esta tralha ortográfica: apesar do cuidado (óbvio) e da competência (reconhecível) a Escola recebe (receciona?) os alunos e encarregados de erro ortográfico em punho (já vi na internet denúncias de situações muito piores, escolas com grafias anárquicas).

 

Já agora, e para que não se diga que agrido a EPM (a obedecer o melhor que pode às dementes ordens oriundas dos saudosistas homográficos) será de consultar com algum detalhe o sítio do Instituto Camões Maputo, sede local da versão portuguesa do português. E ver como também, apesar do evidente esforço, a confusão gráfica ali reina, uma evidente heterografia.

 

A minha solidariedade para os que, em ambos os sítios e nos respectivos "sítios", têm que viver com o Alzheimer lusotropicalista.

 

jpt

publicado às 18:22

Os 50 anos da UEM

por jpt, em 21.08.12

Data de 21 de Agosto de 1962 o Decreto-Lei. 44.530 que criou os Estudos Gerais Universitários de Moçambique, que no Moçambique nacional se tornou Universidade Eduardo Mondlane [a minha fonte é "Ensino Superior em Moçambique. História, Política e Gestão", a tese de doutoramento de Jamisse Taímo].

Isto dos aniversários das instituições é sempre uma convenção. Mas será legítimo escolher assim, dizer que a "UEM" faz hoje cinquenta anos. Parabéns a todos. E da minha parte um muito especial parabéns-obrigado ao DAA, arqueólogos e antropólogos, que tanto me acolheram e acolhem.

jpt

publicado às 01:45

O posfácio dos plágios

por jpt, em 15.06.11

 

Há algum tempo deixei aqui resmungo sobre o plágio nos trabalhos escolares. E já meti outros lamentos do mesmo teor. Mas agora, um agora-mesmo, contacto com outra característica destes processos de "auto-avaliação", tipo posfácio dos plágios. Só ontem deparei-me com três exemplares desta nova metodologia de discência universitária.

 

Os alunos copiadores vêm reclamar das notas, são-lhes mostrados os corpos dos delitos (os putrefactos e mal-cheirosos textos recolhidos em profanações de cemitérios informáticos) e ficam olhando fixamente o professor, aliás o pobre detective. Assim como se ameaçadores, se provenientes do contexto cowboyesco se feitos curandeiros naparama ainda não percebi. Mas com toda a certeza que daqui a alguns (poucos) semestres que haverá resposta sobre métodos e origens destes proto-doutores.

 

Até talvez minha, talvez consiga sobreviver a tão radicais maus-olhados. Pois que "vacinado" já fui, e não foi em Maputo mas nos Nortes e Centros profundos. E também sei fazer o "tal olhar"

 

 

Mas até onde chegará a arrogância desta gente? Ou, des-moralizando isto, não estaremos a viver um radical processo social, e suas transformações nas representações sociais? Não será que o que um antes foi partilha (e reprodução) de saber - quantas vezes excessivamente hierarquizada, até hierática - se está a tornar mera concorrência horizontal por estatutos sociais e privilégios económicos? Feita sem suor nem lágrimas, apenas de sangue?

 

Entretanto, pelo sim pelo não, vou ali calibrar o meu "colt". Mas o que poderá ele contra essas AKs?

 

jpt

publicado às 10:03

Do plágio

por jpt, em 02.03.11
[caption id="attachment_26354" align="aligncenter" width="460" caption="Karl-Theodor zu Guttenberg, ex-ministro da Defesa da Alemanha. Fotografia: Fabrizio Bensch/EPA"][/caption]

Há algum tempo aqui deixei resmungo sobre o plágio na academia, coisa brotada da minha vida profissional, tendo ainda deixado ligação para um interessante texto/debate sobre o assunto Plagiarism is not a big moral deal, de Stephen Fish. É uma praga, a qual aqui detectamos principalmente no contexto do ensino pós-laboral, gente muito mal preparada, usualmente pouco abonada, trabalhadores-estudantes (e não o inverso) sem tempo para estudo, e em busca (como de pão para a boca) de uma certificação que lhes permita alguma ascensão socio-profissional na sociedade moçambicana. Às vezes, em particular quando mais cansado, o contexto "neo-realista" no qual decorre a "coisa" faz condoer o mais empedernido dos professores.

Ao encontrar no Da Literatura a história do barão Karl-Theodor zu Guttenberg, o demissionário ministro da Defesa da Alemanha e dirigente do CSU, o partido social-cristão alemão, agora caído em desgraça política (e pessoal?) por ter sido denunciado que plagiou na sua tese de doutoramento na universidade de  Bayreuth (os manes prussianos devem estar em alvoroço) não posso deixar de convocar as radicais diferenças de contexto. Um comparativismo. Para mais reforçar a inadmissibilidade da cena: no barão de Bayreuth tal como no pobre escriturário da Mondlane. Pois é a única forma de os tomarmos como iguais. Na danada irresponsabilidade. Ou seja, na responsabilidade devida. Condição humana, por assim dizer, sem apuramentos antropológicos ou filosóficos.

jpt

publicado às 03:03

Deslize linguístico

por jpt, em 17.02.11
Um delicioso deslize, esta pequena alteração ao nome da universidade num anúncio de obra.jpt

publicado às 16:27

Uma interessantíssima palestra sobre a necessidade de repensar a forma de pensar o mundo. Como termina com as palavras da nossa Margaret Mead, acima fica o seu selo. A versão animada tem um inglês lesto. Bom mas rápido. Para quem tenha interesse mas dificuldade no seu entendimento veja a palestra imediatamente abaixo, relativamente mais pausada mas sem a animação genial.

E como estas filmes RSA são um filão junto-lhe uma excelente abordagem a questões de educação. A situação em Moçambique é bem diversa (donde "todos os países" que o filme refere no início é uma exagerada generalização) mas há questões (as mais profundas) que se colocam e outras que se colocarão.

Permito-me um apelo aos alunos que por aqui passam. Cliquem, vejam. E vejam outros filmes do RSA Animate - são aulas fantásticas. E divertidas.jpt

publicado às 01:05

O Universo e o Hubble

por jpt, em 21.08.10

"No blog desnudas a alma" exagerou, criticamente, um amigo meu no jantar de ontem:

Como sabem os leitores aqui nunca falo de trabalho, mas segue-se excepção. E como sabem os meus amigos mais próximos, meus colegas e alunos, atravessei (?) um profundo mau-momento nos últimos meses. Não terá sido provocado por isso mas despoletou-se quando percebi que a esmagadora maioria dos alunos universitários com os quais trabalho não têm quaisquer ideias actualizadas sobre as características do universo. Tudo isto brotou numa aula (e nas imediatamente subsequentes) aquando de um impreparado exemplo sobre a "revolução coperniciana" - falava-se de Kuhn numa para mim nova disciplina introdutória de ciências sociais. Ali me deparei, em total espanto, com o facto de que os futuros colegas têm uma concepção geocêntrica do universo ou, em alguns casos, heliocêntrica.

Na altura esta apreensão causou-me uma dolorosa e perplexa consciência do hiato (abismo) ali existente entre nós. E da necessidade de reflectir sobre os conteúdos e formas da comunicação. Como ser docente quando o(s) discente(s) te(ê)m uma tão diversa apreensão do mundo? Para além dos problemas imediatos isto levanta também um doloroso questionar sobre a estrutura curricular do ensino secundário em Moçambique (o que se ensina e quando. E, porventura, também o como). Mas também da divulgação científica nos meios de comunicação. Não se exagerem as dificuldades, quem chega à Universidade tem acesso a televisão, ao omnipresente rádio e, também, a jornais. Lembro de imediato a televisão, pública e privada. Que estação tem divulgado programas sobre o universo?, dedicados a qualquer divulgação científica - certo é que terão que ser atractivos e divulgados, popularizados. E certo é que a estação mais vista pelo povo será a Miramar, cuja filiação evangelista não me parece compatível com versões não criacionistas deste nosso "vale de lágrimas".

Mas não é o meu papel discorrer sobre conteúdos programáticos do ensino de "ciências naturais" (como antes se dizia) no ensino secundário moçambicano nem tampouco sobre o painel de programas da TVM ou concorrentes privadas. Fico-me, angustiado, diante dos meus alunos. Sou um modesto antropólogo, entregue a alguns programas temáticos. E o "mundo" não faz parte deles. Mas sem esse "mundo" que entenderão sobre o mundo, como entenderão o mundo? E como apresentar(-lhes) este vasto "mundo"? Em rombas palavras de nada especialista do assunto? Em pobres fotocópias roubadas a velhos exemplares da editora "Gradiva"? Uma radical impotência.

Recebo agora (via fb) esta ligação ao Sítio do Telescópio Hubble (em inglês). É para os alguns alunos que aqui passam de quando em vez. Pode ser que desperte alguma inquietação sobre o que é "isto". O como é "isto". E dê para perceber que a gente não está no seu "centro". Com tudo o que daí vem. Ou (espera-se) poderá vir.

jpt

publicado às 12:05

[Vitorino Magalhães Godinho, Os Problemas de Portugal. Os Problemas da Europa, Lisboa, Colibri, 2010]

Sobre uma questão que tantas dores de cabeça tem dado, e também nas universidades moçambicanas, aqui por via da importação de modelos influenciados pelo acordo de Bolonha sobre reformas do ensino superior, é interessante ler o mestre Vitorino Magalhães Godinho. É uma longa citação mas vale a pena:

"Sobre o caos em que se tornou o ensino universitário abateu-se o chamado processo de Bolonha, obcecado pela uniformização, baralhando os títulos e graus, e eivado por uma pedagogia simplista. O primeiro acto de qualquer governo com um mínimo de sensatez tem de ser a revogação das abstrusas disposições desse pseudo-acôrdo feito à revelia de professores e investigadores, que não tiveram a coragem de o rejeitar e se sujeitaram a passar sob as forcas caudinas. Uma das riquezas culturais da Europa são as suas escolas superiores diversas (...). Não interessa equiparar títulos, o importante é reconhecer o seu valor universal. Como não interessa que os estudantes saltem de universidade em universidade para seguir os mesmos cursos. Só depois de adquirida sólida preparação é que se está apto a beneficiar da frequência de escolas e centros diferentes, que aliás devem ser criteriosamente seleccionados. Tenha-se o bom senso de não cair no turismo universitário. Temos de regressar à licenciatura como termo de um curso completo, e não etape sem significado. Os mestrados não podem confundir-se com cursos profissionalizantes ou, pior, tomar o lugar de licenciaturas; devem ser preparações exigentes à investigação. A formação e o aperfeiçoamento profissional devem ter os seus cursos próprios." (62-63).

jpt

publicado às 20:43

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[Francisco Noa, A Letra, a Sombra e a Água, Maputo, Texto Editores]

Compilação de textos escritos durante a última década, integrando treze artigos, dedicados a questões da literatura e do ensino, e ainda uma vasta série (cerca de 40) pequenos textos publicados na imprensa, abordando várias questões do social.

O lançamento público do livro ocorrerá na próxima terça-feira, dia 24 de Fevereiro, às 18 h., na Mediateca do BCI. A apresentação será de Júlio Carrilho.

publicado às 22:12

Post para os meus colegas-vizinhos

por jpt, em 23.10.08

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[Hannah Arendt, Entre o Passado e o Futuro. Oito Exercícios Sobre o Pensamento Político, Relógio d'Água, 2006]

Em 1957 Hannah Arendt escreveu "A Crise na Educação" procurando delinear as verdadeiras causas da crise que se anunciava no sistema educacional americano - a qual adivinhava que se estenderia ao mundo -, crise que considerava inserida na crise geral que se derramava "em todas as áreas da vida humana" no mundo moderno. Identificou três ideias-base sintomas dessa crise: o apartar do mundo adulto e do mundo infantil - resultante na absoluta tiranização dos "novos", em paradoxal contradição com o anunciado desejo de os libertar da subordinação face aos mais velhos -, o primado da pedagogia "progressista", "salganhada de coisas com sentido e de coisas sem sentido".

E o processo de infantilização dos alunos, algo que considera como a a-politização do seu devir, algo "que encontrou a sua expressão conceptual sistemática no pragmatismo. Essa ideia-base é a de que se não pode saber e compreender senão aquilo que se faz por si próprio. A aplicação desta ideia é tão primitiva quanto evidente: substituir, tanto quanto possível, o aprender pelo fazer. [...] A intenção confessada não é a de ensinar um saber mas a de inculcar um saber-fazer." (pp. 192-193)

publicado às 01:45

Escola Portuguesa de Moçambique

por jpt, em 05.10.08

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Pacheco Pereira esteve em Moçambique. Agora em Portugal diz: "Eu, que não sou farto em elogios, aqui deixo este, sem qualquer reserva."

Merecido, diga-se, o elogio à Escola Portuguesa de Moçambique, dada a qualidade do trabalho que desenvolve desde a sua inauguração.

Necessário, diga-se, o elogio à Escola Portuguesa de Moçambique, que nunca se sabe se o "Terreiro do Paço" tem noção de quanto e como se trabalha "lá fora". Mas sabe-se o quanto, por vezes, lá irrita o acesso à sombra da Trichilia Emetica (a mafureira). Por todas estas razões é bom quando esta(s) voz(es) sonante(s) soa(m).

publicado às 00:28

Entre 29 de Setembro e 1 de Outubro. Texto introdutório no blog da Escola. Pressionando a imagem seguinte poder-se-á consultar o programa.

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publicado às 11:15

Saber-Fazer

por jpt, em 16.09.08

No De Rerum Natura há um luminoso excerto de entrevista a Maria do Carmo Vieira, professora de Português. Para além da crítica a particularidades de reformas no sistema de ensino em Portugal ali estão presentes traços gerais desta moda - economicista e anti-intelecto - do ensinar a "saber-fazer", tão na moda nas propostas "reformistas" no ensino em Moçambique. Uma pobreza ideológica que aparece disfarçada de discurso técnico.

publicado às 19:38

Escolinha

por jpt, em 31.05.08

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[Maio de 2008]

Escolinha, bairro Maringué, Gembesse. Colega e seus alunos.

publicado às 13:52


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