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[Italo Svevo, Um Embuste Perfeito, Quasi, 2008, tradução de Vasco Gato]

Mario Samigli é um literato triestino de sessenta anos. Publicou na juventude um romance, esquecível e esquecido. Desde então dedica-se à escrita de fábulas anódinas, e a uma vida casta, vazia e rotineira, habitando na companhia de seu irmão mais velho, Giulio, única audiência das suas construções literárias. Tudo isso nada lhe pesa, convicto que está da sua futura celebridade, da grandeza da sua obra: espera, calmamente, o seu reconhecimento, e disso retira uma quase-muda sensação de superioridade face aos demais e uma satisfação generalizada face à vida. Um dia, em pleno final da I Guerra Mundial (aquando da tomada de Trieste aos alemães-austríacos), um seu conhecido, Gaia um caixeiro-viajante popularucho, e que também tivera os seus devaneios poéticos na juventude, lança-lhe um embuste: uma celebrada editora internacional anunciara-lhe o propósito de editar o romance de Semigli. Pouco depois o pobre escritor descobre que tudo não passa de um embuste, ridicularizando-o.

Mas Svevo é aqui pacato, trata com desvelo as suas personagens, poupa-lhes sofrimentos extremados  e desilusões radicais. Semigli continuará o seu percurso literário, aceitando a condição doméstica da sua literatura, as pobres fábulas partilhadas como registo de amor com seu irmão.

No final, de imediato resmungo com a docilidade do livro, sem o abismo que prometia esta trama sobre a crença no sucesso, sua absorção, sobre a realidade da constante desilusão humana. Mas depois solidarizo-me, eu afinal Semigli. Pois não teria Svevo, se escrevesse hoje, feito do protagonista um mero bloguista?

jpt

publicado às 03:20


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