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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
[Jean-Pierre Vernant, Pandora, la Première Femme, Bayard, 2006]
Um pequeno livro que é uma delícia, reproduzindo o texto de uma conferência proferida em 2005. Como será óbvio trata-se da interpretação do texto cosmogónico de Hesíodo. De como o colaboracionismo do pequeno deus Prometeu permitiu aos homens aceder a um mínimo de conforto por via do acesso à carne, ao vegetal cultivado e ao fogo. E de como a represália maliciosa consistiu nessa oferenda dessa cadela deslumbrante, ladra carismática, devoradora insaciável: Pandora. Portadora que foi de todas as desgraças, de todo o mal, mas também da ideia de futuro - da crença e da esperança -, ou seja de humanidade.
Mas isto é sabido, e nem justificaria o post. Este vem do eco da má-disposição do leitor. Estou eu deliciado com a leitura e de súbito irrito-me com a política do autor (mas quem sou eu para criticar o Vernant?). Pois diz ele, fiel à ideia do Prometeu revolucionário, que este é como um "soixante-huitard". Ora nada! Titã aliado de Cronos, do partido apeado do poder anárquico (do poder de ditar a e viver em anarquia), Prometeu procura intervir na nova legislação, matizar a tendência oligárquica no Olimpo, filantropicamente redistribuindo os bens para conforto dos pobres desapossados. Quanto muito, e até exagerando, Prometeu é um social-democrata. Nada vermelho. E nisso peca Vernant.