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A morte de Luiz Pacheco

por jpt, em 07.01.08

Morre Luiz Pacheco. "E agora quem é que "eles" vão entrevistar....?" logo me veio à cabeça. Depois lembrei uma entrada que há dois anos aqui meti sobre o escritor (e sobre o como surgia ele em espírito pre-mortem em alguns blogs literários). Com muito respeitinho, que não sou dos ofícios das literaturas. Mas auto-referencio-me, nem que seja para (me) lembrar como terminei:

"O Génio é uma longa paciência" (Luiz Pacheco, Figuras, Figurantes e Figurões, Lisboa, O Independente, 2004, p. 178). Ganda Pacheco, faltou-te a dita?"

Mais valia ter estado quieto, leio hoje por todo o lado o evocar do seu génio. Um sapateiro não toca rabecão exactamente por isso - não reconhece o génio alheio. Mesmo quando gosta da melodia.

publicado às 02:30

Pacheco

por jpt, em 24.02.06

[Luiz Pacheco, Literatura Comestível, Lisboa, Estampa, 1972]

Releituras rápidas, coisas de ler os livros todos de seguida, que um novo levou a outros da estante. Neste (bem) mais velho temas que me ligam, acima de tudo o cansaço, e em Pacheco logo na época, com o Delfim, de Cardoso Pires, que senti quando o reli aquando do filme (não vi o filme, claro, Fernando Lopes é-me tabu "desde" a Crónica dos Bons Malandros, o "desde" entre aspas porque metáfora, o filme não existe portanto o "desde" é intemporal).

"Uma derradeira reticência: como Mário Dionísio perspicazmente detectou, o rendilhado labor estilístico de J.C.P. atinge neste livro altitude inigualada. Mas sente-se muito isso. Quando um prosador (consumado; é o caso) comete o gravíssimo erro de não nos deixar esquecer, pelo contrário: permanentemente desdobra diante dos nossos olhos o seu virtuosismo pisando-nos os olhos com ele, faz-nos criar a suspeita que essa sua constante preocupação oculta algo. Por exemplo: nada." (113) Mouche? Que o Delfim envelheceu parece-me, leigo vindo em gerações vindouras, óbvio. E talvez por causa dos requebros. ["Agora este está armado em literato?" pergunta o visitante - nada! eu gosto é muito do Cardoso Pires, menos deste Delfim, é só por isso ...].

Mas neste Literatura Comestível acima de tudo muito pouca coisa, questíunculas lá da pequena história da literatura portuguesa, zangas, tricas e isso, pouco interessantes hoje (que é me [nos] que interessa o plágio do Namora ao Vergílio Ferreira, e como este o denunciou? e outros obscuros etcs) e se calhar sempre. Textos envelhecidos. Livro-bairro. Ou, naquele então, país-bairro?

Súbito, sorriso, a sentir-me familiar, "onde é que eu já li isto?", assim como se em blog, aprés la lettre, heranças metodológicas ou mais-que-isso:

"Depois de uma leitura muito enojada, repito, e tal o atesta o meu volume todo sublinhado, anotado, riscado, vincado, do que afirmo e afirmarei ser uma das obras mais porcas da literatura portuguesa ..." (85)

E já que vinha ao caminho passo ao, este sim, livro


[Luiz Pacheco, O Libertino Passeia por Braga, a Idolátrica, o seu Esplendor, Lisboa, Colibri, 1992]
o texto a manter a pica passados os anos, quarentão já. Mas depois olho o livro, lá vem com a adenda "Depoiamento de uma angolana", de Maria Veiga Pereira, com mão de Alfredo Margarido, e enrolado em textos de apresentação e apósentação (Victor Silva Tavares, Júlio Moreira, Alexandre Pinheiro Torres a chamar-lhe "poetização da miséria, esplendor negativo" (??!), mais 3 desenhos inclusos em edições prévias, de Carlos Ferreiro (1) e Henrique Manuel (2), e fac-simile do manuscrito original), tudo isto à volta de nem-30 páginas de prosa: nítido, o embrulho a querer-se produção de um mito, pedra a pedra, livro a livro. Assim como, e isto já me veio à cabeça, a causa "por mais um velho do Princípe Real" - atenção, estamos para aí a 18 anos do centenário. E, entretanto, chamem lá o Le Carré, para o "cameo". Honestamente, o texto mantém a pica, mas caramba, é uma coisinha. Terá sido mais no seu tempo. Pobre tempo, não pobre texto. Mas também rico esse tempo, que por ele engrandece o texto.

E isto tudo foram regressos a propósito de quase-calhamaço de ardina, livros que se trazem em Lisboa quando se vai comprar o Record, acaba-se de "sair" do quiosque com um suplemento Barbie para a Carolina e o Pereira Coutinho, o Pacheco, o Ramos e o Venceslau (que raio de perfil de colecção lançou o Independente!? Não... a Barbie [com colar e pulseira] não fazia parte).



[Luiz Pacheco, Figuras, Figurantes e Figurões, Lisboa, O Independente, 2004]-

Baratinho (as tralhas dos jornais são-no sempre), e a valer a pena. Muita destruição (Urbano Tavares Rodrigues, Ferreira de Castro, a revista, o JL - p. 163, pequeno período justificável de visita que o PS merece - enfim coisas lá do tempo dele, e outras também mais do nosso) com arreganho de mastim. Depois anuncia-se à gente, mas hoje é despedida (o texto "Crítica de Identificação" é de 1971 mas, sem pudor algum, o mórbido editor usa-o para encerrar o livro), propósito seu que é agora rescaldo: "fazer o que geralmente não vejo que se faça, isto é, aclarar publicamente tramas que se ocultam, apontar flibusteiros das Letras, pondo-lhes a careca à mostra embarrilando-os pela gargalhada; sempre que preciso, denunciar os compromissos de vária ordem em que se atolam os nossos pseudointelectuaizinhos que por aí andam a governar-se à larga, seguros na sua impudência e da sua impunidade mercê das circunstâncias" (194).

Mais sorrisos meus, coisas de então e de hoje. Projectos de vida. Mas, honestamente, a mim parecem-me mais é angústias com alheias mercês. E, muito sobretudo, coisa de sobrevalorizar os tais livros e gentes - o mundo corre pior por causa da maus romances? de contos coxos? de poemas torpes? do prémio a ou afago b? Separar o trigo do joio implicará ficar, enraivecido, a tri-tu-rar o joio? Ou não será melhor ir comer uma bela sandes de panado, panito quente, forno caseiro, piri-piri sacana?

Insisto, bons pensares em cima de uma sobrevalorização, complicações de mira. Angústias também, decerto.

Súbito "E que significa tudo isto? A coexistência de culturas mui diversas, de mui estranhas origens, umas arcaicas, tradicionais, outras em plena fase embrionária, nos primeiros tentames duma aclimatação. Culturas paralelas, misturadas, alheadas umas das outras e isto tudo num mesmo tempo histórico, porque a história é radicalmente transição (Jaspers, ainda uma vez)." (18) "A POLÉMICA É A RAZÃO DA NOSSA PERMANÊNCIA." (19)

Um texto para hoje, em tempos de "choque civilizacional"? Logo o apanho, é bom apanhar estes textos já antigos e roubá-los aos autores, manipulá-los a nosso gosto, até truncá-los, na nobre arte da citação, como se eles concordassem conosco (melhor dizendo, nós com eles), fazê-los (já mortos ou para isso preparados, textos e autores digo) pensar o que queremos. Eis-me nessa parece-que-legítima actividade, dissertando sobre o real circundante.

Mas, afinal, o homem estava a falar dos romancistas, Chiado acima, Chiado abaixo. Faço-me entender? O sentimento de desperdício do pensar, enredado nas discussãozinhas afinal elas ...

"O Génio é uma longa paciência" (178). Ganda Pacheco, faltou-te a dita?

publicado às 02:17


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