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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
(Ilha do Zambeze, entre Manica e Tete, meados de 00s)
Março passado, já em Março, numa sexta-feira fui jantar com grande amigo, daqueles ... Chegados àquilo dos cafés quis pedir uísques, novos e parcos por causa dos preços, mas ele negou-se. Pois vive fora de Lisboa, iria guiar, não podia passar daqueles dois ou três copos de vinho que corrêramos. Viu-me desencantado e aventou que fosse eu para casa dele, beberíamos algo noite fora, nisso conversaríamos, dormiria eu por lá e regressaria no dia seguinte de comboio. A sede apertava, assim fiz(emos). Na manhã, já sábado feito, hora do almoço, regressei à capital no tal cavalo-de-ferro, indo para um seminário, não sabia ainda que para ouvir daqueles antropólogos emp(r)enhados, cheios deles mesmos a julgarem que isso são causas, aquelas aparentes das gentes com as quais trabalharam, observando-as. Aportei à estação de Entrecampos no intuito de me chegar ao ISCTE, o local onde falaria o revolucionário encartado, por corso doutoral, e alguns outros. O dia ia soalheiro e ali mesmo na Av. da República, enquanto marchava, tirei o casaco, pendurando-o no indicador direito e abandonando-o ao ombro, mesmo como se funcionário. Depois, já na esquina da "Forças Armadas", avenida assim ascendente, e porque o calor já apertava, transpirando-me, tirei o pull-over. E só depois, alguns passos passados, me apercebi, quase lacrimejando, e digo-o sem exagero: estava em mangas de camisa, ainda que compridas. E há mais de seis meses que não andava na rua assim.
Lembro-me muito disto, do gélido que andei, e do como tanto o notei naquele dia d'alvorada da primavera, esfuziante com aquela liberdade de súbito sentida. E hoje mesmo ainda mais, este hoje entre 8 e 9 do Setembro. Pois faz agora um ano que parti de Moçambique regressando à "Pátria Amada" (aquele tão pleonasmo moçambicano). E porque um blog é mais do que tudo um diário aqui refiro a data, partilhando um bocado, ainda que sem o dizer, do que quebrou então mas que se vai colando devagar no esforço das cálidas mãos amigas. Pois é difícil o regresso, quase-exílio no princípio. A sarar também, que Portugal é lindo. E, muito mais do que tudo, porque "basta viver", como aprendi, um duro dia, lá no Zambeze.
Para cantar isso, essa verdade, deixo 4 canções, 3 que são "standards" e uma, a "Piloto Automático", que o virá a ser. Como se banda sonora da vida, esta que me basta ...
Esta semana, no próximo sábado, Stewart fará um espectáculo no Coliseu de Lisboa.
Fica aqui um aviso para os que estão (mais ou menos) perto, para que não deixem de assistir. Gosto muito de Stewart - algo que afixei há alguns anos neste texto longo: "O Clube Social do Belo Horizonte". Para quem não conhece a cena musical moçambicana ficam aqui alguns filmes de canções de Stewart. Que é agora a grande celebridade no país, o músico popular, um grande profissional num campo onde o profissionalismo é difícil e, muitas vezes, auto-torpedeado pelas idiossincrasias artísticas. E em assim sendo mantendo uma simplicidade única, uma simpatia com os admiradores, "sem coisas", sem ademanes, que o tornam ainda mais querido aos que o rodeiam, de perto ou bem de longe.
Recuperando e retrabalhando os ritmos da música urbana, "marrabentando" se quisermos um registo simples, Stewart tem outro atributo, que também vem do tal profissionalismo de atenção ao pormenor - é um excelente músico de palco. E por isso abaixo deixo gravações feitas em espectáculos, para além de alguns dos seus sucessos.
Sábado lá estarei, neste meu registo lisboeta d'agora, bilhete único. Acompanhando-me do ali. Festa, decerto.
Azagaia, o conhecido músico moçambicano, contestário, difícil para nós, os instalados, tem um tumor cerebral. Esta é a campanha para congregar a quantia necessária para a urgentíssima operação. A solidariedade, se activada, poderá resolver isso. "Já!".
Há pouco, ao ter conhecimento da situação e desta campanha, logo me ocorreu estarmos aqui, em Maputo, em plena FACIM, a feira industrial e comercial internacional, marco anual da vida da cidade. Sempre fazendo deslocar inúmeras comitivas empresariais e até políticas. Responsabilidade social empresarial", "relações públicas", "cooperação", até "marketing" poderão ser palavras indutoras da resolução num ápice desta dramática situação.
Mas que essa mera hipótese, a da solidariedade das elites económicas, não nos adormeça a vontade de colaborarmos, na medida das nossas possibilidades.
É mera superstição matemática isto de acharmos que após determinado número de dias acaba qualquer coisa, um ano por exemplo, e que devemos fazer rescaldos do que se passou no último naco de tempo, para a este impor marcas. Também é certo que a vida sem estas coisas, superstições e marcações, teria menos piada. Por isso mesmo escolho a personalidade moçambicana do ano.
Certo que num ano tão complexo para o país muitos poderão olhar outros redutos do social. Para mim a personalidade pública que mais se destacou foi a Associação para o Desenvolvimento Cultural Kulungwana: constante no apoio privado (ainda que não economicista) às artes plásticas, com um painel cuidado de exposições e de colaborações; muito bem sucedida na realização do Xiquitse - temporada(s) de música clássica em Maputo, algo cada vez mais sedimentado, descentralizado e com público local. Mas mais do que tudo com a belíssima iniciativa, investimento, de participar na 6ª Feira de Arte de Joanesburgo, aí apresentando uma boa exposição, “TempoRealTime”, fotografias de Filipe Branquinho, Mario Macilau e Mauro Pinto. Belos trabalhos excelentemente apresentados, numa acurada curadoria de Berry Bickle. A mostrar um caminho cosmopolita, na realização e na produção, que urge nas artes moçambicanas. E, sem qualquer hesitação, no resto das actividades nacionais.
Por isso aqui fica a minha vénia à Kulungwana!
É uma clássica, de Abílio Mandlaze.
Djavan não é exactamente "a minha praia", coisa do gosto pessoal. Mas é um artista de mão cheia. Recentemente, e por duas vezes, esteve para actuar em Moçambique, venderam-se bilhetes, e depois tudo foi cancelado. Deram brado as situações, julgo que uma por doença inesperada do músico (acontece) e outra por incumprimento contratual do produtor aqui (não deveria acontecer). Enfim, episódios que ficaram na história do "show business" em Moçambique - infelizmente demasiado polvilhada por episódios menos bem conseguidos, com alguns produtores a desrespeitarem o público. Agora Djavan vem aí, mesmo, numa produção mais cuidada e competente.
Dia 12 de Setembro em Maputo, como ele aqui anuncia o seu "djávenho" - até para acalmar as desconfianças dos anteriormente desiludidos:
E aqui um excerto de Djavan em 2013, no espectáculo que vem aqui apresentar, na íntegra.
Então divirtam-se lá no espectáculo ...
*Não resisto a este piscar de olho a este particularismo do português moçambicano, isso da constante troca do "ir" pelo "vir"...
Quem esteja em Maputo tem agora uma temporada de música clássica. O programa detalhado está em xiquitsi.