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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
[Naguib Mahfouz, Akhenaton, o Rei Herege, O Quinto Século, 2007]
O meu primeiro livro de Mahfouz e logo sobre esta intrigante e apaixonante personagem histórica, Akhenaton o faraó monoteísta. Uma completa desilusão. A estratégia narrativa é simplista (uma colecção de entrevistas aos participantes na odisseia de Akhenaton, para daí traçar o seu perfil psicológico). E um enorme rosário de anacronismos: o protagonista, o jovem Miriamon, é o arquétipo do "intelectual", desinteressadamente apaixonado em busca da verdade, essa que paira acima dos homens ou melhor, deles é modal. Os participantes, quase todos enredados numa abordagem psicologista ao anterior faraó (como é possível?), assim explicitamente afirmando que da psicologia individual teria brotado a nova religião. Alguns deles, pró-Amon e pró-Aton, com uma perspicácia sociológica sobre a ligação entre a religião estatal e o controle político da população - o culto politeísta, sob o reino de Amon, visto como forma de controlar a população e de aquisição e controle de bens pela "classe" sacerdotal.. E mais do que tudo, Akhenaton como origem do dualismo, raiz da filosofia ocidental: fala Akhenaton "Tu dás mais importância ao corpo, como se ele fosse tudo, enquanto a verdadeira força está no espírito, pois ele é eterno. Quanto ao corpo, ele é uma estrutura fraca, suja e imoral, que se desmorona com uma simples picada de insecto" (p. 106), um registo que não me parece derivar de um qualquer "afrocentrismo" mas sim das prisões do autor no conceber a espiritualidade, a religião e, em particular, o edifício monoteísta.
Enfim, se é para aludir aos dias de hoje em regime de manifesto, é uma grosseira caricatura. Se é uma tentativa de reconstrução, analítica, é pobre. Muito pobre. Como ficção inexiste.
Edição [muito feia] de O Quinto Selo, com tradução de Adel A. Jabbar Mohammed Daroga.
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