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"…cheguei a um acordo perfeito com o mundo: em troca do seu barulho dou-lhe o meu silêncio…" (R. Nassar)
Nina Berbérova, "A Ressurreição de Mozart" (Ambar, 2004, tradução de António Pescada, 2,5 euros em 2012 [vale a pena]). Uma pequena narrativa escrita ainda em 1940, deixando-nos a invasão alemã de França, e a debandada civil aquando da queda de Paris. Tudo vivido por um pequeno grupo de russos residentes ("russos brancos", dizia-se em tempos). Diante do espanto acontecido surge a ideia de convocar o(s do) passado, porventura para entender o presente. Ou para cobrar aos profetas as suas profetices:
"Isto não deve ser encarado com frivolidade. Eu aproveitaria a ocasião para trazer Lev Tolstoi a este mundo de Deus. Não foi o senhor, meu caro, que negou o papel do indivíduo na história? Que afirmou que não haveria mais guerras? E não foi o senhor, meu caro, que mostrou cepticismo acerca da vacinação contra a varíola? Não, agora não se esquive, venha ver o que resultou de tudo isso." (13)
jpt[Nina Berbérova, A Acompanhadora, Ambar, 2003, tradução de António Pescada]
Sónetchka é a jovem pianista acompanhante da bem sucedida cantora Maria Nikoláevna Trávina. Feia, sem brilho, sem particular talento, esta filha ilegítima de uma modesta professora de piano parte com a sua protectora (a cantora) para Moscovo no tempo da revolução comunista. E daí para Paris, o exílio russo dos anos 20. Sempre presente o constante ciúme, nem sequer racionalizado, da pianista pela Trávina, à qual deve o desafogo. Um ciúme cego, manso, que a levará a tramar a perdição da sua protectora, ainda que tal não ocorra - nem para tal tem talento. A Trávina partirá, no seu sucesso musical e amoroso. Deixando-a para trás, e sem a ter realmente entendido, ela que é personagem vazia até da sua própria auto-compreensão. Do livro fica-me um eco da pobreza mental real, do vazio existente. De que nem nos apercebemos - o dos outros, o nosso próprio.
jpt