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"De Fogo em Fogo e outros poemas", um conjunto de poemas de Raffaele Carrieri apresentados num pequeno opúsculo, uma curta edição (150 exemplares) bilingue, integrando versões de António Cabrita do trabalho do poeta italiano. Não quero apoucar o interesse do poeta (que é, radical e realmente, o que interessa) mas é o objecto que me chega às mãos que me chama a atenção imediata. Em primeiro lugar porque a edição da traduções, de prosa ou de poesia, é raríssima em Moçambique (mesmo de obras escritas em línguas nacionais). Neste caso a publicação inseriu-se nas actividades da X Semana da Língua Italiana no Mundo e é uma produção da Escola Portuguesa de Moçambique, a contar com o apoio da embaixada italiana.

E nisso radica uma segunda dimensão do meu interesse. Pois uma publicação destas ecoa (e até simboliza) as crescentes actividades em Maputo dos sectores culturais das representações diplomáticas, em particular a espanhola e a italiana (para além da institucionalização ainda recente do Instituto Goethe). Ainda que modestas, e não particularmente exigentes, estas actividades que se vão somando ao já habitual cenário agitado pelo Franco-Moçambicano, o Camões e o CEB (entretanto "correctamente" rebaptizado), dão um tom mais aberto ao ambiente cultural na cidade que, por vezes, tende a enquistar.

Mas é a um terceiro nível, basto surpreendente, que este pequeno livro me entusiasma. Pois denota a capacidade, absolutamente original, da Escola Portuguesa, uma instituição estatal portuguesa, de se abrir à cultura estrangeira. Ou seja de entender a sua presença, como agente de formação e de divulgação da língua e da cultura portuguesa, de conceber a sua actividade (o seu pelouro), como um potenciação das capacidades de tradução e de abertura. Uma visão cosmopolita.

Isto, que em teoria parece absolutamente pacífico, é absolutamente original, tamanha a tendência castrense [lusocastrense, por assim dizer] que ocorre habitualmente nessas instâncias - e falo, frise-se, das instituições radicadas em Lisboa. Presumo (e nisso estou quase certo de estar certo nesta especulação) que uma obra destas não corresponde a um projecto global, que será mais produto de uma articulação incidental, uma vontade momentânea da embaixada italiana cruzando-se com a fervilhante actividade do bom do António Cabrita. Mas ainda que assim sendo o simples facto de encontrar responsáveis estatais portugueses a trabalharem no estrangeiro (e na CPLP ainda por cima) com abertura para usar o português língua para traduzir e não apenas para narrar a gesta do entre Fernão Lopes e Gonçalo M. Tavares é um acaso extraordinário. Uma sorte. Para continuar?

Do breve livro (36 poemas) deixo dois.

Invejo a LulaMuito invejo a lulaQue se eclipsa no se preto:Branco é o seu recobro, a salvoNo variável azul.
e uma versão muito daqui ...
Deixai-me Sozinho com os RiosDeixai-me sozinho com os riosDeste cacimboQue calcina a planícieE o osso preto dos montes.Deixai-me sem fagulhasComo a mais esquiva lenha,Aos outros a visibilidadeA consciência e a luneta.
jpt

publicado às 09:39


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