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Não sei se será da idade, sublinhada pela velocíssima aproximação ao proto-centenário, mas em olhando para as estantes de ficção cada vez mais me dá para a releitura, como se "revisão da matéria dada":

 

"De facto, o pior dos meus defeitos era uma disposição demasiado jovial, que faria o enlevo de muitos, mas que eu considerava irreconciliável com o desejo dominante de me dar grandes ares e mostrar em público um aspecto sisudo e grave. Por isso tratei de ocultar os meus divertimentos e comecei a olhar à minha volta, pesando os progressos feitos e a minha posição na sociedade. Já era profunda a duplicidade do meu carácter. Muitos homens teriam confessado certos erros de que me considerava culpado; mas com os altos propósitos que visava, não me convinha senão escondê-los, e fazia-o com uma mórbida sensação de vergonha. Assim o ordenava a natureza das minhas aspirações, mais do que a própria degradação dos pecados; ia-se cavando em mim, mais do que na maioria dos mortais, esse profundo fosso que separa o mal do bem e divide e compõe a dualidade da nossa alma. Neste caso eu era levado a meditar, de maneira penetrante e irresistível, naquela pesada lei da vida, que jaz na base da religião e é uma das mais largas fontes das aflições humanas. Ainda que tão entranhadamente dissimulado, não era o que se chama um hipócrita. Ambas as minhas inclinações estavam na força do entusiasmo; não pus maior ardor quando perdi a continência e mergulhei na ignomínia do que quando trabalhei, à luz do dia, pelo avanço dos meus conhecimentos e alívio de dores e tristezas. E aconteceu que o sentido dos meus estudos científicos, que me conduziam à mística e às coisas transcendentes, suscitou e derramou imensa claridade neste carácter de guerra permanente entre o bem e o mal em que me debatia. Em cada dia, as duas partes da minha inteligência, a moral e a intelectual, atraíam-me mais e mais para esta verdade, cuja descoberta parcial fora em mim condenada a tão pavoroso naufrágio: que o homem não realmente uno, mas duplo. Digo duplo, porque o estado do meu conhecimento não passa além desse ponto. Outros poderão prosseguir, outros exceder-me-ão nestes limites; mas atrevo-me a conjecturar que o homem será um dia caracterizado pela sua constituição multiforme, incongruente e cheia de independência."

 

(Robert Louis Stevenson, O Médico e o Monstro, pp. 115-117)

publicado às 17:53

Jim Hawkins

por jpt, em 13.11.10

No meio da insónia abro o Google e encontro-me no mundo de Stevenson, o seu 160º aniversário. Muito livro lido. Mas mais do que tudo, quem nunca foi Jim Hawkins? Vou à estante. Para ser, agora, na alvorada do ocaso, Long John Silver ...

jpt

publicado às 05:29


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