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Fagin le Juif, de Will Eisner

por jpt, em 20.09.08

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Will Eisner está para além dos adjectivos, mas como falar dele sem os usar? Este Fagin le juif (Delcourt, 2004) é um livro extraordinário. Artisticamente é sumptuoso - poderia ser de outro modo? Sendo a obra um diálogo crítico com "Oliver Twist", o mundo de Dickens, tão gráfico ele próprio, é eisnerizado de um modo tal que somos brindados com um universo coerente mas que reclama uma dupla paternidade. Enriquecedora. Só por este exemplo máximo do mundo de Eisner o livro é imperdível.

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Mas há mais. Eisner reentra em Oliver Twist, convocando o próprio Dickens à liça. E nisso desmonta os preconceitos anti-semitas carregados pelo autor. Pois este, arquétipo da inquietação com a "questão social", fonte de tanta denúncia literária, jornalística e filosófica da injustiça social, enredava-se no preconceito prejudicial (passa a aparente redundância) face aos judeus, estigmatizados nesta personagem "Fagin". Assim demonstrando a hierarquia das preocupações sociais de então. E, como Eisner diz, até pela penetração na literatura infantil que "Oliver Twist" veio a ter (sua desvalorização no senso comum?), assim contribuindo para reprodução continuada de estereótipos racistas. Dickens homem do seu tempo? Não só,  pois ele próprio evoluindo a sua concepção, disso consciente, como o mostraram as suas tentativas de retrabalhar a figura de Fagin, o velho judeu, em edições posteriores de Oliver Twist (tentativas infrutíferas, dado o enorme sucesso inicial da obra, obstando à sua substituição). Nisso, porventura, indiciando também alguma mudança à época das concepções sobre judeus nos meios letrados britânicos.

Mas na limpeza que Eisner faz não há traço do mero correctismo. Há um recontar da história, olhando-a de outro modo, olhando os contextos de formação dos indivíduos, não como desculpabilizadores/desresponsabilizadores (o que é isso da "culpa", da "responsabilidade"?) mas como enquadradores das opções e dos percursos. Assim longe do essencialismo dickensiano (de que a personagem Twist é exemplo máximo), um atender aos contextos, à gente formada nas circunstâncias. Para além do aparente bem e mal. Gente boa e má, não boa ou má.

Óbvio se torna que é também produto (como não o poderia ser?) de uma visão sociologicamente muito mais rica do que a que lhe é um século e meio anterior - assim ficando exemplo de como a leitura racialista, racista, essencialista, é acima de tudo uma leitura ignorante, iletrada, ainda que tantas vezes treslida.

publicado às 00:13

Eisner

por jpt, em 08.01.05

Narciso, já aqui me autobiografei exaustivamente. E já aí o referi, ao Will Eisner do Spirit e não só. Comigo desde a revista "Spirit", seis números durados, lá pelos meados dos 70s (não tenho as referências, guardados os exemplares em Lisboa). Agora morto o autor, a vénia claro está. De admiração e gosto.

publicado às 13:39


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